DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS II
O marco inicial da emancipação e do reconhecimento constitucional dos direitos humanos já possui uma tradição de aproximadamente 250 anos de história (Declarações de 1776 e 1789). Essa processo enfrentou grandes desafios, mas se consolidou como um marco civilizacional. Na sociedade internacional, contudo, a referida trajetória é bem mais recente e está profundamente vinculada aos graves fatos que aconteceram durante a Segunda Guerra Mundial.
Tal referência é muito importante por que começaram a indicar uma grande mudança histórica: a ideia de que as soberanias dos Estados deveriam ser de alguma forma limitadas. Essa percepção decorre da constatação que o número de mortos na guerra podia ser contados aos milhões e que, muitas destas mortes, foram friamente planejadas por políticas oficiais de determinado Estado. Em consequência, as lições foram grandes. Entre essas uma se destaca: a necessidade de refletir sobre os atos cometidos. É que muitos dos atos que envolveram a Segunda Guerra Mundial implicaram uma ruptura com os direitos humanos e com a ideia de dignidade humana.
A consciência desta ruptura deixava claro que era fundamental a reconstrução dos direitos humanos e sua afirmação para além das fronteiras nacionais. Neste sentido, estava claro que, como lembra Flávia Piovesan, o tema da violação dos direitos humanos não poderia mais “ser concebida como questão doméstica do Estado, e sim como problema de relevância internacional como legítima preocupação da comunidade internacional” (Piovesan, 2004, p. 118).
Este movimento do Segundo Pós-Guerra caminhou para a conversão dos direitos humanos em um dos temas centrais da sociedade internacional (Gomes, 2000) e impulsionou a elaboração, no decorrer dos últimos setenta anos, de um conjunto muito importante de documentos legais e que atualmente formam a base da proteção internacional dos direitos humanos.
A proteção referida indica que houve uma universalização da preocupação com a proteção das pessoas, seja nas relações internas ou externas, e que os seus principais instrumentos legais construídos de um conjunto de prerrogativas que passaram a “fazer parte do patrimônio da humanidade” (Douzinas, 2009, p. 18). Assim, fica claro que a proteção internacional dos direitos humanos ultrapassa as fronteiras e estabelece limites a todas as atividades estatais e ao exercício da soberania do Estado, mesmo nas situações de grandes conflitos.
Desta forma, foi formado o sistema internacional de proteção dos direitos humanos. Este sistema protege os direitos de qualquer ser humano quando o Estado é negligente, é omisso ou é o autor da violação dos direitos (Piovesan, 2004) e pressupõe que os Estados sejam instituições políticas que aceitam a mediação de normas coletivamente definidas para a regulamentação de suas ações e para a limitação de suas prerrogativas políticas, econômicas e jurídicas.
Nesse contexto, é importante lembrar da grande importância que adquiriu também a formação dos chamados Sistemas Regionais de Direitos Humanos. De fato, o mundo possui, na atualidade, três sistemas regionais importante e já claramente consolidados ou em amplo processo de consolidação. Os três sistemas regionais são o Sistema Europeu de Direitos Humanos, O Sistema Interamericano de Direitos Humanos e o Sistema Africano de Direitos Humanos.
Os três subsistemas regionais possuem um papel fundamental na atualidade. Essa relevância é justificada seja pela atuação dos seus órgãos administrativos (de supervisão, de prevenção e de orientação) e judiciais (de solução de conflitos específicos) – cada vez mais efetiva – como pela maior convergência cultural dos Estados que compõe o respectivo sistema regional. Daí, portanto, a sua maior legitimidade política e seu sentido de pertencimento mais efetivo.
O Grupo de Trabalho de Direito Internacional dos Direitos Humanos II do XXVIII Encontro Nacional do Conselho de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito – CONPEDI, realizado em Goiânia no dia 20 de junho de 2019, reuniu trabalhos que abordaram e aprofundaram muito dos temas que envolvem a proteção internacional dos direitos humanos. São temas que desafiam o leitor a refletir sobre variados aspectos, desde uma análise histórica dos Direitos Humanos até temas que passam pela análise do atual cenário nacional e internacional.
Daí o destaque dado pelos artigos aos seguintes temas: Da igualdade formal à igualdade material: uma análise histórica a partir das três gerações de direitos humanos; A sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Vladimir Herzog e outros versus Brasil; A responsabilidade internacional do Estado e controle de convencionalidade; A tutela do direito à saúde na Corte Interamericana de Direitos Humanos: uma análise sob a perspectiva do caso Poblete Vilches vs. Chile; Principais influências das convenções internacionais no programa de Compliance adotado na lei nº 12.846/2013 (lei anticorrupção); Os refugiados: limites e desafios jurídicos no campo da fronteira conceitual; O princípio pro homine e a lei de migração: breves considerações; O Estado Constitucional Cooperativo: contexto, traços fundamentais e sua materialização no Estado Constitucional Europeu; Direitos humanos na perspectiva do direito internacional europeu; Imperialismo dos direitos humanos? O tratamento controverso da proibição de edição de leis de anistia como norma de Jus Cogens pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. A violência sexual contra à mulher na guerra da Bósnia-Herzegovina: o estupro como arma e crime de guerra; Interação transnacional no Mercosul para proteção dos direitos humanos; O ritual de passagem dos índios Mardudjara e a (não) universalidade dos direitos humanos uma particular concepção sobre dignidade humana a partir do respeito à diversidade cultural; Direito à consulta prévia, livre e informada no Brasil: o caso dos indígenas Awá-Guajá no maranhão; O direito ao desenvolvimento para os povos quilombolas como direito humano; Justiça de transição espanhola: uma página ainda não virada; O método tópico de Theodor Viehweg e a questão jurídica dos deslocamentos humanos: uma análise antinômica entre a dignidade da pessoa humana e a soberania dos estados.
Todos temas, como se pode ver, muito atuais, e trazem uma visão multifacetada dos Direitos Humanos e do Direito Internacional e destacam a discussão sobre a importância dos direitos humanos fundamentais como uma construção histórica e como um marco civilizatório fundamental.
Prof. Dr. Gilmar Antonio Bedin (UNIJUÍ e URI)
Profa. Dra. Mauridês Macedo (UFG)
Nota Técnica: Os artigos que não constam nestes Anais foram selecionados para publicação na Plataforma Index Law Journals, conforme previsto no artigo 8.1 do edital do evento. Equipe Editorial Index Law Journal - publicacao@conpedi.org.br.
ISBN: 978-85-5505-790-8
Trabalhos publicados neste livro: