XXVIII ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI GOIÂNIA – GO

CONSTITUIÇÃO E DEMOCRACIA II

O Grupo de Trabalho dedicado à apresentação e discussão de pesquisas científico-jurídicas referentes à seara da imbricação entre constituição e democracia correspondeu à expectativa suscitada pela atualidade, dramaticidade e relevância do tema no atual contexto sócio-histórico global, pautado por transições, tensões e crises relacionadas a díade conformadora do constitucionalismo democrático, que emerge no Ocidente a partir do século XVIII e consolida-se como fundamento triunfante das nossas sociedades a partir da segunda metade do século XX.

A tensão entre a rigidez associada ao constitucionalismo e o dinamismo próprio à legitimação democrática da autoridade política é um tema tão instigante como onipresente no pensamento humanístico e nos conflitos sociais desde o século XIX. Os receios de Mill e Tocqueville em relação aos riscos de tiranias majoritárias, de um lado; e os clamores republicanos em favor de uma primazia das decisões coletivas para além das reservas constitucionais, de outro; pautaram boa parte da trajetória jurídico-política da modernidade em seu estágio posterior ao iluminismo. As vozes de Locke a ecoarem sobre o apreço liberal pelas normas que afastam do debate político as condições de possibilidade da sua própria existência, e de Rousseau a saudarem variantes contemporâneas de uma vontade geral entendida como soberana em seus próprios termos, ainda se entrecruzam em um debate contínuo e profícuo. Neste processo, tentativas de síntese ou de composição entre o primado republicano da democracia e a conquista liberal do constitucionalismo, a exemplo da tese habermasiana de equiprimordialidade entre as autonomias pública e privada, parecem apenas estabelecer uma efêmera trégua em uma saudável e instigante tensão constitutiva do constitucionalismo erigido em sociedade plurais, complexas, seculares e referenciadas no duplo valor daquilo que Constant definira como as liberdades moderna e antiga.

Este Grupo de Trabalho ocorre em um momento no qual a recorrente contenda entre liberais e republicanos afigura-se ínfima, diante de uma ameaça mais séria e fundamental ao constitucionalismo democrático: vivemos sob tempos em que democracias perecem globalmente e o primado dos direitos fundamentais ou de sua projeção universal em um sistema assegurador de direitos humanos fenece. A emergência de populismos não democráticos, a naturalização do desprezo às garantias fundamentais prescritas nas constituições e a emergência de hegemonias que, antes de definidas por novas ou alternativas razões, negam a racionalidade enquanto fundamento da vida social, parecem por em risco os dois mais preciosos consensos da nossa civilização: constitucionalismo e democracia.

Nestes tempos dramáticos e intensos, a produção acadêmica vê-se desafiada e convidada a encontras categorias, métodos, teorias e fundamentos capazes, senão de apontar rotas de saída da crise, de permitirem sua mais adequada e analiticamente refinada compreensão. Esta missão, acredita-se, fora cumprida pelo conjunto de pesquisadores/as que apresentaram seus artigos jurídicos no Grupo de Trabalho sobre Constituição e Democracia. Três grandes eixos do debate, tal como abaixo explicados, asseguraram a completude e a consistência da produção científica trazida ao GT nesta edição do Encontro Nacional do CONPEDI.

Primeiramente, destacam-se os trabalhos referentes a temas situados na fronteira entre a filosofia, a teoria política e a teoria da constituição. Nesta seara, houve contribuições referenciadas em uma plêiade atualizada e consistente de referências, oscilantes da teoria luhmaniana dos sistemas ao pensamento heiddegeriano, sem que faltassem estudos referenciados na produção do Sul Global, em especial quanto ao Novo Constitucionalismo. A fundamentação, a coesão, os limites e os desafios para a difícil e necessária composição entre democracia e direitos fundamentais foram, nestes trabalhos, perquiridos em grau de compatibilidade com a dificuldade e urgência dos problemas impostos pelo momento histórico presente.

Em seguida, mencionam-se os artigos identificados com a temática da jurisdição constitucional ou, ainda mais amplamente, do processo constitucional. Em um mundo no qual fenômenos como judicialização da política e politização da justiça conduzem ao limite as ideias liberais de checks and balances, indicando na prestação jurisdicional que dá concretude aos ditames asseguradores de direitos fundamentais o preciso locus da fronteira entre democracia e constituição, os trabalhos souberam lidar com problemas de pesquisa e olhares teóricos dignos de contribuírem para o permanente avanço científico nesta questão.

Houve, ainda, artigos dedicados a estudos sobre direitos fundamentais sem os quais a cidadania democrática e a própria dignidade de pessoas que se engajam em uma comunidade jurídico-política na condição de jurisconsortes livres e iguais não poderia realizar-se. Assim, o tema dos direitos de pessoas com deficiência, a questão migratória e as políticas orientadas à garantia do direito fundamental à moradia foram trazidos à baila em produções que refletem a mais desejável combinação entre rigor científico e compromisso social da atividade acadêmica no campo jurídico.

A sessão de apresentação dos trabalhos refletiu a qualidade dos textos que o/a leitor/a lerá a a seguir e indicou que, sob os mais tormentosos tempos para a democracia e os direitos fundamentais, o campo jurídico brasileiro não esmorece e enfrenta, com seriedade e consistência, a tarefa de compreender e defender estes dois alicerces do mundo livre, racional e secular. Desejamos a todos/as uma boa leitura.

Prof. Dr. Francisco Mata Machado Tavares - UFG

Profa. Dra. Camila Barreto Pinto Silva - UNIMES

Nota Técnica: Os artigos que não constam nestes Anais foram selecionados para publicação na Plataforma Index Law Journals, conforme previsto no artigo 8.1 do edital do evento. Equipe Editorial Index Law Journal - publicacao@conpedi.org.br.

ISBN: 978-85-5505-774-8


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