XXVIII ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI GOIÂNIA – GO

TEORIAS DA JUSTIÇA, DA DECISÃO E DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA

Na ocasião do XXVIII do Encontro Nacional do CONPEDI, o GT Teorias da Justiça, da Decisão e da Argumentação Jurídica reuniu pesquisas notadamente na área da hermenêutica jurídica. O debate científico realizado a partir das treze pesquisas apresentadas teve como foco os princípios, com forte ênfase doutrinária. A maior parte dos trabalhos enfrenta questões de ordem teórica e outra parte analisa casos concretos.

De um lado, a precisão e a objetividade das regras atendem aos ideais de segurança jurídica, previsibilidade e estabilização das relações sociais. De outro lado, a generalidade e subjetividade dos princípios possibilitam a flexibilidade do direito frente às especificidades dos casos concretos. O excesso de ênfase nas regras pode afastar a equidade, entendida como a adaptabilidade do direito na aplicação da justiça no caso concreto, ao passo que o excesso de princípios pode conduzir a uma ampliação prejudicial e desmedida das possibilidades de interpretação,

Como o juiz deve interpretar as leis? Essa resposta não está nas leis – salvo poucas exceções nas quais a própria legislação dispõe que algo deve ser ou não deve ser interpretado de determinado modo. Também não está na ciência jurídica, pois não há consenso teórico a respeito disso. Kelsen, na Teoria Pura do Direito, se perguntou se existe uma interpretação ideal, melhor do que as demais, e respondeu que não há. Então o juiz faz uma escolha de qual técnica interpretativa empregar no momento da prestação jurisdicional. É sobre essa escolha que recai toda a preocupação da hermenêutica jurídica. É nesse ponto que política e direito se encontram, pois determinada concepção de direito e de sociedade será levada em conta nessa escolha, isto é, alguns valores e conceitos serão tomados como ponto de referência na decisão judicial.

É nesse sentido que Thiago Serrano Pinheiro de Souza e Edna Raquel Rodrigues Santos Hogemann defendem que a interpretação principiológica não pode prescindir de uma sólida teoria hermenêutica do direito, alertando para o risco do uso indiscriminado dos princípios e promovendo uma reflexão sobre a ideia de discricionariedade judicial, própria do que alguns teóricos denominam como pós-positivismo. No mesmo tema, Vitor Oliveira Rocha Fontes escreve sobre a discricionariedade judicial, com base no pensamento de Dworkin, apresentando críticas à teoria neoinstitucionalista do processo. A abertura que os princípios conferem à interpretação do direito pelo poder judiciário torna possível o fenômeno do ativismo judicial, tema que é estudado por Francisco José Rodrigues de Oliveira Neto em contraste com o princípio da legalidade. O autor analisa tal questão tendo como plano de fundo a distinção entre o poder legislativo e judiciário. Na mesma esteira, considerando a necessidade da interpretação para a efetividade do direito, Ana Cristina Lemos Roque e Leiliane Rodrigues Da Silva Emoto procuram demonstrar como a hermenêutica é fundamental para a concretização dos direitos fundamentais. Caroline Lais da Silva Stelmach, por sua vez, discute a teoria da integridade de Dworkin, relacionando-a com o Direito Processual Civil brasileiro.

Alguns trabalhos do GT, sem perder de vista o debate hermenêutico, tiveram como foco um problema concreto. Maria Eliane Carneiro Leão Mattos e Gabriela Martins Carmo criticam a abertura conferida pela discricionariedade judicial no que diz respeito aos alimentos provisórios, levantando discussões baseadas em Hart, Dworkin e Alexy, sobre os limites do poder de interpretação dos juízes. Évelly Salvador Miranda e Cleide Aparecida Gomes Rodrigues Fermentão analisam, com base nos direitos fundamentais, o direito ao nome do natimorto, como direito da personalidade, construindo uma interpretação analógica, tendo como referência o nascituro. As autoras apontam a necessidade de uma legislação federal para regulamentar essa questão, mas ponderam as possíveis consequências que tal direito poderia deflagrar no âmbito do direito civil.

O texto de Anna Paula Bagetti Zeifert e Emmanuelle de Araujo Malgarim aborda a ideia de existência de uma razão pública, refletindo criticamente sobre o que seria o bem comum, partindo do pensamento de John Rawls. Este autor também é referencial teórico no trabalho de Giovanni Galvao Vilaca Gregorio, que constrói uma reflexão sobre o direito à saúde entendido como bem social primário, tendo como base a teoria da justiça como equidade. Com base no mesmo filósofo, Jean Carlos Dias e Shirley da Costa Pinheiro analisam o conceito de justiça distributiva, a partir das relações entre igualdade e desigualdade. Além disso, os autores apresentam uma reflexão sobre como as desigualdades sociais deflagram diferentes graus de liberdade individual. Mauricio Fiorito desenvolve uma pesquisa sobre a justiça distributiva e a equidade, com base em Aristóteles, para pensar, a partir disso, questões relacionadas à justiça eleitoral.

Sublinhando a pluralidade de autores e teorias que permeiam o tema do GT, o trabalho das pesquisadoras Barbara Santos Rocha e Amanda Fernandes Leal abordam um caso concreto envolvendo decisões da justiça eleitoral no município de Valença, no Piaiu, analisadas sob a perspectiva da teoria de Amartya Sen, tendo em vista ideias de ações afirmativas, direitos políticos e igualdade de gênero. Por fim, Maria Izabel Dos Reis Rezende e Viviane Aprigio Prado e Silva têm como objeto de pesquisa o anteprojeto de lei anticrime proposto por Moro. As autoras elaboram reflexões sobre a proposta legislativa tendo como referências os pensamentos de Dworkin, Streck, Rawls e Abamben, discutindo as ideias de leis injustas e desobediência civil.

Essas são, em linhas gerais, as pesquisas que integram o GT Teorias da Justiça, da Decisão e da Argumentação Jurídica dessa edição do XXVIII Encontro Nacional do CONPEDI. O debate entre os pesquisadores que apresentaram trabalhos e os coordenadores do GT resgataram a clássica distinção grega entre o governo de leis e o governo de homens. As leis não são autoaplicáveis, por isso não há um governo só de leis. Os agentes públicos do Estado, em todas as esferas, não agem como querem, mas são vinculados à legislação, por isso não há um governo só de homens. O poder é exercido por homens, com base em leis. Estas se expressam por meio da linguagem, sobretudo escrita, e é por esse meio que os homens constroem, conhecem e aplicam as normas. Portanto, a interpretação é necessária. Pensando assim, pode-se falar de um governo de intérpretes, isto é, de homens com base em leis. É nesse ponto que as discussões do GT revelam sua importância e atualidade, pois pensar sobre a interpretação do direito é pensar sobre como o poder legítimo é exercido na sociedade.

Goiânia, junho de 2019.

Prof. Dr. Heitor de Carvalho Pagliaro - UFG

Prof. Dr. Mateus Eduardo Siqueira Nunes Bertoncini - UNICURITIBA

Nota Técnica: Os artigos que não constam nestes Anais foram selecionados para publicação na Plataforma Index Law Journals, conforme previsto no artigo 8.1 do edital do evento. Equipe Editorial Index Law Journal - publicacao@conpedi.org.br.

ISBN: 978-85-5505-804-2


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