DIREITO CIVIL CONTEMPORÂNEO
A presente coletânea é composta dos trabalhos aprovados, apresentados e debatidos no Grupo de Trabalho: “Direito Civil Contemporâneo”, no âmbito do XXXI Congresso Nacional do CONPEDI, realizado entre os dias 27 a 29 de novembro de 2024, na cidade de Brasília/Distrito Federal, no Centro Internacional de Convenções do Brasil (CICB), e que teve como temática central: “Um olhar a partir da inovação e das novas tecnologias”.
Os trabalhos expostos desenvolveram de forma verticalizada diversas temáticas atinentes ao Direito Civil Contemporâneo, especialmente na relação dialogal com os Direitos da Personalidade, as novas tecnologias e a consequente democratização do Direito Civil. As pesquisas ora apresentadas funcionam como canais indispensáveis nos debates e propostas das pendências existentes nos campos indicados e na busca de soluções efetivas para as problemáticas indicadas.
Gilberto Fachetti Silvestre aborda os aspectos críticos da medicina defensiva e do uso de seus métodos preventivos para a aplicação do regime jurídico da responsabilidade civil do profissional da saúde por erros cometidos em diagnósticos e no exercício das demais atividades inerentes à profissão médica.
Manoella Klemz Koepsel, Feliciano Alcides Dias e Helena Maria Zanetti de Azeredo Orselli investigam os desafios impostos ao Direito Civil Contemporâneo a partir da aplicação da função social dos contratos digitais no atual cenário brasileiro, levando em consideração o avanço tecnológico e os impactos causados pela era digital na sociedade informacional.
Maria Amélia da Costa reflete sobre a evolução do instituto da usucapião familiar, ou por abandono de lar, a qual, desde seu surgimento no ordenamento jurídico sempre foi alvo de críticas e também de dúvidas a respeito de sua aplicação nos casos concretos. Muitas dessas dúvidas surgiram em razão das lacunas existentes na norma, e foram, pouco a pouco, sendo supridas pela jurisprudência e pela literatura jurídica.
Tatiana Oliveira Mendes de Carvalho, Rafael Campos Soares da Fonseca, Reynaldo Mendes de Carvalho Filho investigam a aplicabilidade do instituto do adimplemento substancial em momentos de calamidades públicas, como enchentes e desastres industriais, têm impactos profundos nas relações contratuais. No Brasil, eventos recentes como a enchente no Rio Grande do Sul e o desastre da Vale em Minas Gerais evidenciam essa influência. A pesquisa explora o adimplemento substancial, que permite que devedores contestem a exigência de cumprimento total de suas obrigações quando uma parte significativa já foi cumprida. Defendem os autores que, em contextos de calamidade pública, é crucial conciliar este instituto com os conceitos de caso fortuito e força maior, conforme o Art. 393 do Código Civil Brasileiro, que exime os devedores de responsabilidades em situações imprevistas e inevitáveis.
Simone Gomes Leal e Fábio Romeu Canton Filho alertam sobre as questões relacionadas à arbitragem online, fenômeno da contemporânea sociedade da informação, consequência da expansão tecnológica. As tecnologias da informação e comunicação (TICS) têm proporcionado uma verdadeira revolução na vida das pessoas. As inovações envolvendo as tecnologias abrangem, desde o primeiro computador, assim como os bens dragáveis essenciais para o desenvolvimento econômico que ocorreu logo após as primeiras Revoluções Industriais, até a internet que, conectada a dispositivos informáticos, proporciona um novo ambiente para o convívio da sociedade. Esse novo ambiente é capaz de acelerar os procedimentos, devido à dinamicidade de acesso a diversos tipos de meios de comunicação, que agiliza a comunicação entre as pessoas, colocando-as em contato, encurtando as distâncias territoriais, e proporcionando celeridade, agilidade e segurança aos novos procedimentos da arbitragem. A Câmara do Comércio inovou com as ODR`s, facilitando a vida de quem tem lides que tratem de direitos disponíveis.
Keylla Thalita Araujo , Willian Tosta Pereira de Oliveira e Laryssa Martins de Sá tratam da proteção conferida ao direito de imagem na era digital, tendo em consideração que o avanço tecnológico permite o compartilhamento e a disseminação de imagens com precisão e velocidade antes inimagináveis. Analisam os contornos do direito de imagem na sociedade da informação, a partir da proteção conferida pela Constituição Federal de 1988, pelo Código Civil de 2002 e pelo Marco Civil da Internet. Investigam a sistemática adotada para a responsabilização dos provedores de aplicações de internet, o entendimento conferido ao assunto pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), e o cenário atual brasileiro sobre o tema, mormente, diante do posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF). Foi utilizada a metodologia da pesquisa teórica, além da análise de precedentes do STJ e STF a respeito da tutela do direito à imagem na internet e responsabilidade civil dos provedores de aplicações de internet. Insta destacar que o Marco Civil da Internet representou um importante avanço na regulamentação do tema, mormente, por estabelecer parâmetros para a responsabilização dos provedores de aplicações de internet, contudo reclama uma proteção mais refinada sobre o assunto. Concluem que o STJ tem decidido cada vez mais sobre o assunto e definindo novos parâmetros, além daqueles já previstos na legislação, de modo a mitigar o constrangimento à honra e a exposição desnecessária dos indivíduos. Outrossim, a análise do Tema nº. 987, pelo STF, pode representar uma oportunidade para aprimorar o debate sobre como o ordenamento jurídico brasileiro lida com a relação usuários-provedores de aplicações de internet.
Em outro trabalho, Gilberto Fachetti Silvestre realiza um estudo que compara a aplicação da renegociação contratual como remédio para solucionar a onerosidade excessiva superveniente de um contrato, considerando as normas jurídicas contratuais previstas nos Códigos Civis romeno e brasileiro. A pesquisa analisa o que é e como se aplica a renegociação contratual, bem como sua importância para a manutenção da relação contratual a partir da iniciativa, da autonomia e do juízo de conveniência das partes. O trabalho demonstra que a revisão contratual na Romênia é protagonizada pelas próprias partes, cabendo ao Judiciário intervir somente quando a renegociação for frustrada. Claramente, esse regime jurídico preserve a enaltece o papel das partes na satisfação de seus interesses. No Brasil, por outro lado, as propostas de reforma do Código Civil iniciadas em 2023 não valorizaram a renegociação como um remédio contra a onerosidade excessiva e a favor de manter a relação contratual. Ao contrário, a revisão contratual permanece dependente da atuação Judiciário, reforçando um papel histórico de dependência de soluções judiciais. Conclui-se que o Direito Contratual romeno avança na proteção das liberdades e intenções das partes, ao passo que o Direito Contratual brasileiro, mesmo sendo reformado, mantém-se dependente do arbítrio judicial, o qual, não raramente, ignora a intenção das partes.
Cláudia Gil Mendonça e Marina Bonissato Frattari propõem uma análise sistêmica sobre lei de franchising e as obrigações das partes no cumprimento contratual, especialmente no dever de sigilo relativo ao know-how quando expresso na Circular de Oferta de Franquia (COF), bem como em relação a terceiros, como o cônjuge do franqueado. Ao final, concluem que, para que haja sigilo e não concorrência entre as partes no relativo ao objeto do know-how, a cláusula que os prevê deve ser expressa e bem delimitada, devendo haver com clareza a proibição à atividade, tempo e local. Além disso, deve prever a abrangência de cônjuges ou não, a fim de se evitar burlas, como por exemplo, a abertura de empresa similar à franquia em nome destes, a partir do know-how aprendido, ensejando, pois, em responsabilização do franqueado. Caso não haja obediência a esses requisitos, a cláusula poderá ser considerada abusiva, sendo levada ao Judiciário para ser rediscutida.
Izabella Affonso Costa e Ana Cláudia Corrêa Zuin Mattos do Amaral investigam, sob a ótica do Direito Civil, a liberdade econômica como um importante pilar para o desenvolvimento dos países no capitalismo. Com o advento da globalização, as negociações a nível internacional respaldam e fomentam a economia dos países em especial em casos como o do Brasil, em que há grande quantidade de matéria-prima excedente, valendo-se da exportação como forma de geração de renda e base da economia nacional. No entanto, aspectos referentes às restrições legais ligadas à autonomia privada, como a aplicação de princípios contratuais contemporâneos e a legislação mais protetiva, fazem com que a liberdade econômica permaneça no alvo das discussões, motivando, com isso, o presente estudo que visa abordar alguns aspectos referentes à necessidade de compatibilização da liberdade econômica como forma de garantir a competividade dos produtos brasileiros a nível internacional, sem perder de vistas a necessária proteção a ser dada a certos tipos contratuais específicos em que se reconheçam assimetrias.
Para Rogerio Borba , Luan Berci e Marcela Maris Nascimento de Souza, as inovações tecnológicas decorrentes da Revolução 4.0 fomentaram novas dinâmicas de interação no ambiente virtual, impulsionando a popularização das redes sociais, com destaque para aquelas sob a administração da Meta, que abrange os aplicativos Facebook, Instagram e WhatsApp. Concomitantemente, o setor dos jogos de azar adaptou-se ao cenário digital, ampliando suas possibilidades de atuação. Nesse contexto, ao final de 2023, verifica-se uma nova estratégia publicitária dessas empresas nas plataformas digitais, sendo o Jogo do Tigrinho uma das mais proeminentes. Diante desse cenário, a pesquisa visa analisar se o assédio promovido por jogos de azar contraria os termos de uso das plataformas Meta, o Código de Defesa do Consumidor e a Lei Geral de Proteção de Dados, buscando identificar as implicações jurídicas contemporâneas dessa prática no contexto digital em junho de 2024.
Diogo Magro Webber e Amanda Antonelo, a partir do método descritivo-analítico, abordam a proteção da privacidade e segurança dos dados pessoais, sobretudo os dados sensíveis, é essencial para a garantia dos direitos constitucionalmente assegurados. Considerando a crescente disseminação de informações no meio digital, a criação de dispositivos de proteção torna-se imprescindível para salvaguardar os usuários contra o uso inadequado de seus dados. Na hipótese de violação dos dados pessoais, tem-se o dever do agente responsável de responder pelos danos causados. Desse modo, a presente pesquisa busca entender o tipo de responsabilidade civil a ser adotada nos casos de vazamento de dados pessoais, diante da obscuridade deixada na Lei Geral de Proteção de Dados, assim como analisar a possibilidade de ser aplicado o dano in re ipsa nos dados sensíveis.
Helena Maria Zanetti de Azeredo Orselli , Priscila Zeni de Sá e Janine Miranda Weiner Vicente da Silva, traçam um panorama do diagnóstico genético pré-implantação (PGD), o qual consiste em uma técnica, disponível a casais ou indivíduos, que recorrem à reprodução humana assistida, para averiguar a existência de doença genética no embrião a ser implantado e, a partir disso, selecionar os embriões. No contexto brasileiro, a utilização do diagnóstico genético pré-implantação traz questões éticas e jurídicas, especialmente em relação à conformidade com os princípios que protegem a dignidade humana e os direitos fundamentais.
Gabriella Schmitz Kremer e Jéssica Fachin investigam a responsabilidade aplicável à pessoa ou empresa pela falha na segurança dos dados pessoais. Nesse sentido, analisam duas importantes decisões, sendo do Superior Tribunal de Justiça, no ARESP 2130619-SP, e do Supremo Tribunal Federal, na ADI 6393, a fim de verificar de que modo tem se aplicado a responsabilidade civil em casos dessa natureza.
Com grande satisfação coordenamos e apresentamos a presente obra, agradecendo aos autores(as)/pesquisadores(as) envolvidos(as) em sua produção pelas profícuas reflexões surgidas e debatidas, bem como reiteram e louvam a dedicação e competência de toda a equipe do CONPEDI pela organização e realização do exitoso e arrojado evento, realizado em Brasília/Distrito Federal.
Reiteramos a esperança que a obra ora apresentada sirva como parâmetro acadêmico para a compreensão dos problemas da complexa realidade social sob a óptica civilista. Desejamos leituras proveitosas na construção de uma nova perspectiva para os desafios impostos ao Direito Civil no contexto contemporâneo transpandêmico de utilização dos mecanismos dos Direitos da Personalidade como força motriz da democratização do Direito Privado, bem como na manutenção dos paradigmas hermenêuticos da eticidade, operabilidade e sociabilidade.
Prof. Dr. Fabio Fernandes Neves Benfatti- UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais)
Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior- UFC (Universidade Federal do Ceará)
ISBN: 978-65-5274-039-7
Trabalhos publicados neste livro: