DIREITO, ARTE E LITERATURA
Poucos Grupos de Trabalho do CONPEDI têm tido uma produção tão regular, tanto em quantidade quanto em qualidade, como o GT Direito, Arte e Literatura. A partir das conexões entre Direito, Literatura, Cinema e outras formas de expressão artística, os trabalhos apresentados têm evidenciado como o recurso às artes podem contribuir para compreendermos melhor o Direito, tanto internamente (no modo como ele é operado) quanto externamente (em sua relação com o problema da Justiça).
Nesta edição não é diferente. Perpassando os trabalhos nela apresentados, podemos identificar a preocupação com a discussão sobre a dialética entre os fins que o Direito se propõe e os mecanismos de efetivação dos direitos que se apresentam na sociedade, entre a representação que se faz da realidade e a própria realidade, entre os sonhos de uma sociedade mais justa e solidária e as condições matérias da vida. Nessa dialética, às vezes a norma jurídica toma a dianteira, agindo sobre a realidade social; em outras ocasiões, é a realidade social que altera profundamente o nosso entendimento sobre o alcance e o significado da norma jurídica. Sempre, no entanto, produz-se uma realidade distinta daquela de que se partia, mas que contempla e contém os pontos de partida, ainda que em uma tensão constante.
Alguns dos trabalhos apresentados privilegiaram o cinema como mecanismo de denúncia, mas também como mecanismo de propaganda dos valores dominantes em uma sociedade. Esse é o caso dos trabalhos de Bruna Barbieri Wakim e Héctor Valverde Santana (Coisa mais linda: A transformação do Direito de Família à luz da transformação do Direito Das Mulheres), de Camila Martins de Oliveira e Ana Virginia Gabrich Fonseca Freire Ramos (Preciosa: As consequências jurídicas e extrajurídicas da invisibilidade social) e de Émilien Vilas Boas Reis e Ana Luíza Dionísio Mota Lacerda (Uma análise jusfilosófica do filme O Expresso do amanhã: A velha locomotiva continua com os mesmos hábitos). O primeiro trabalho, mostrando a necessidade de se ter voz para se ter vez, parte da análise do choque entre a representação da realidade e a própria realidade. O segundo trabalho explora como algumas normas não conseguem proteger os sujeitos que pretendiam amparar porque eles sequer se tornam visíveis como atores sociais. O terceiro trabalho explora como o Direito acaba estabelecendo fins incompatíveis em si mesmos, como pode ser o caso de certo desenvolvimento econômico e da preservação do meio ambiente.
Um segundo grupo de trabalhos parte de obras clássicas da literatura para analisar o descompasso entre a vida social e o próprio Direito. Esse é o caso do trabalho de Flávia Moreira Guimarães Pessoa e Glauber Dantas Rebouças (Da Utopia de More à utopia brasileira: O que será), que explora a oposição entre um Direito utópico e uma realidade distópica; do trabalho de Douglas Lemos Monteiro dos Santos e Maicon Wando da Silva Freitas (Uma leitura de Shakespeare à luz da teoria política moderna como ferramenta para o ensino do Direito: a noção de poder em Macbeth), que explora o uso do Direito como mecanismo legitimador ou desligitimador do poder político instituído; do trabalho de Mauro Augusto Ferreira da Fonseca e Tiago Moita Koury Alves (Os Sertões de Euclides da Cunha à luz do desenvolvimento como liberdade), que explora a impossibilidade de se desenvolver a liberdade (e a legitimidade) sem que haja, como fundamento, real igualdade de oportunidades; o trabalho de Gabriela Brito Ferreira e Vitor Hugo Duarte das Chagas (Livro 1984 de George Orwell, sob a ótica de Norberto Bobbio em Democracia e Segredo), que analisa o problema da visibilidade e publicidade como condição de legitimidade do poder político; e o trabalho de Arthur Ramos do Nascimento (Desconstrução dos indivíduos LGBTQ+ nos canais de massa: Riscos de Blacklash e a arte como instrumento de influência do discurso dos Direitos Humanos Fundamentais) em que se investiga como a cultura de massas transitou de uma concepção na qual a arte era um mecanismo de controle para uma concepção na qual ela passou a ser entendida como mecanismo de libertação.
Um terceiro grupo de trabalhos analisou algumas obras de Literatura para demonstrar o processo pelo qual se o Direito se produz em sua aplicação. Em A pornografia de vingança como violência de gênero a partir da obra 13 segundos de Bel Rodrigues, Rosália Maria Carvalho Mourão pressupõe a pergunta se é a arte que imita a vida ou a vida (e o Direito) que imita a arte; e Maurício Muriack de Fernandes e Peixoto (Direito e literatura: Capitu, Scrooge, o Juiz Hércules e a resistência da jurisprudência à efetivação do artigo 489 do Código de Processo Civil de 2015) se pergunta se o Direito pode, enfim, demonstrar algo mais do que o pressuposto pela própria norma jurídica, e assim se é o Direito que é limitado pelo mundo ou o mundo que é limitado pelo Direito.
Todas essas contribuições colaboram para uma compreensão mais ampla e mais verdadeira do Direito que temos, e a sonhar com o melhor Direito que podemos quer para transformar nossa sociedade.
Goiânia, 20 de junho de2019.
Prof. Marcelo Campos Galuppo (PUC Minas/UFMG)
Prof. Rosália Maria Carvalho Mourão (Centro Universitário Santo Agostinho - UNIFSA – Pi)
Prof. Pedro Sérgio dos Santos (UFG)
Nota Técnica: Os artigos que não constam nestes Anais foram selecionados para publicação na Plataforma Index Law Journals, conforme previsto no artigo 8.1 do edital do evento. Equipe Editorial Index Law Journal - publicacao@conpedi.org.br.
ISBN: 978-85-5505-799-1
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