TRANSFORMAÇÕES NA ORDEM SOCIAL E ECONÔMICA E REGULAÇÃO
O ano de 2020 segue trazendo obstáculos e desafios. Ninguém ficou à margem da pandemia que assola o globo e afeta diretamente os espaços social, político, econômico ou jurídico. Porém, para alguns, as dificuldades têm sido maiores. A pandemia é desigual.
Esta realidade não passou despercebida pelos pesquisadores que se reuniram no Grupo de Trabalho Transformações na Ordem Social e Econômica e Regulação, no dia 05 de dezembro, no âmbito do II Encontro Virtual do Conpedi. Cada um em sua casa, todos juntos em um diálogo rico e construtivo, permeado por reflexões extremamente relevantes e que ajudam a compreender o mundo de hoje e pensar o de amanhã.
Como de hábito nos encontros do Conpedi, praticamente todas as Regiões brasileiras se viram representadas, em um amálgama plural e, ao mesmo tempo, uníssono na preocupação em construir um pensamento jurídico socialmente orientado.
Os artigos apresentados podem ser agrupados em dois eixos de discussão que, em conjunto, permitiram um debate abrangente sobre diferentes e relevantes temas relacionados ao Direito e Economia.
Um primeiro teve por foco debates sobre o papel do Estado e análises acerca de suas deficiências enquanto garantidor dos direitos fundamentais e dos interesses coletivos, quadro que se evidencia enfaticamente diante da crise sócio econômica trazida pela pandemia.
Neste conjunto, foram apresentados estudos sobre:
a) A natureza do modelo neoliberal de Estado e a preponderância de um mercado que depende profundamente da ação estatal para garantir suas liberdades e reforçar sua capacidade de dominação sobre os espaços produtivos, em especial as relações de trabalho (Regulação do trabalho, neoliberalismo e pandemia);
b) A força das empresas e a fragilidade dos Estados no contexto da expansão globalizante, com destaque para a busca por vantagens competitivas em detrimento da proteção às pessoas, a limitar a abrangência dos sistemas regulatórios nacionais (Crise do estado-nação: impactos fiscais frente à globalização econômica);
c) O desafio de construir uma ação integrada e cooperativa entre os países para enfrentar a pandemia do Covid-19, o que não ocorreu, mostrando a fragilidade de Estados e organismos internacionais (A demagogia nas questões de enfrentamento do covid-19 em âmbito internacional e o paradoxo da ineficácia de políticas públicas);
d) O papel da OMS como reguladora global de políticas de saúde pública, suas condutas e deficiências, com destaque para a fragilidade dos parâmetros jurídicos adotados pela OMS para coordenar as ações dos países, face à não vinculatividade de suas medidas (A covid-19 no contexto da saúde global: uma análise sobre a efetividade da Organização Mundial da Saúde e de suas normas);
e) A tibieza do sistema protetivo, em especial o marco civil da internet, diante da disseminação das fake news, fenômeno que tem feito com que a primazia tradicionalmente conferida à liberdade de expressão passe a ser sopesada (Bases principiológica e conceitual sobre o fenômeno da desinformação e da “fake news”: conflito entre a liberdade de expressão e a privacidade na sociedade da informação);
f) A natureza jusfundamental da privacidade e os desafios trazidos pela revolução tecnológica, com sua enorme disseminação na circulação de dados pessoais, dados que viram uma espécie de capital para as empresas (A proteção de dados pessoais: função social e atendimento da finalidade da ordem econômica);
g) A digitalização das relações sociais, fenômeno que promove uma aproximação crescente entre pessoas e máquinas, pela via da presença cada vez mais constante da inteligência artificial, e que traz a questão: quais os limites para a possibilidade de apreensão da vontade humana? (Inteligência artificial e repercussão em direitos fundamentais: relações com integração, autonomia e digitalização da sociedade);
h) A ausência de um sistema normativo internacional de controle sobre as práticas das empresas transnacionais e os freios que estão previstos na Constituição brasileira e que funcionam como garantia de respeito à função social que a atividade econômica deve ter (Empresa e sua função social à luz da Constituição Federal);
i) A importância de as decisões jurídicas e econômicas serem embasadas em análises abrangentes, que consigam considerar os vários riscos em jogo e a necessidade de as decisões serem tomadas de forma transparente e isonômica (Coronavírus e premissas das decisões judiciais: risco, provisoriedade e falta de um cenário macro);
j) A busca por equilibrar o direito à educação com a proteção à saúde, de forma adequada às necessidades de estudantes com deficiência, dificuldades que se conectam primordialmente à capacidade de docentes e discentes lidarem com estes alunos, sendo esta a maior barreira à aplicação das normas já existentes voltadas a assegurar a inclusão (A sala de aula invertida e a inclusão das pessoas com deficiência no ensino jurídico em tempos de pandemia);
k) O conceito e as origens do patrimonialismo, tradição arraigada no Estado brasileiro, e sobre as normas jurídicas voltadas a coibi-lo (As raízes do patrimonialismo no brasil e suas consequências no estado contemporâneo).
O segundo eito temático contemplou estudos mais focados em aspectos regulatórios, mas que nem por isso deixaram de ressaltar a preocupação com as necessidades sociais e os impactos que as decisões estatais produzem sobre a vida das pessoas.
Aqui se encontram artigos que tratam:
a) Das alterações regulatórias trazidas para o sistema financeiro diante das necessidades sociais criadas pela pandemia, como o acesso ao auxílio emergencial, e a expansão da bancarização (A pandemia como fator de incentivo à digitalização do sistema financeiro nacional);
b) Das variáveis em discussão nas PECs que objetivam promover a reforma do sistema tributário e seus potenciais impactos sobre o segmento dos produtores e consumidores de leite (Breves comentários sobre os impactos da reforma tributária no segmento dos lácteos);
c) Da nova regulamentação aplicada aos alimentos de origem animal, com ênfase para as repercussões sobre o setor lácteo, com destaque para a crítica à ausência de debates antecedentes à edição do decreto (Comentários ao Decreto nº 10.478/2020);
d) Da relação entre setor de distribuição de energia elétrica e de comunicações, em uma análise dos marcos regulatórios aplicáveis ao compartilhamento de infraestrutura pelos dois setores (O fenômeno do compartilhamento dos postes à luz de ferramentas da análise econômica do direito);
e) Da contabilidade gerencial como ferramenta necessária a todos os envolvidos com a gestão empresarial, de modo a permitir um melhor planejamento tributário (O princípio da não-cumulatividade como ferramenta do controller);
f) Do sistema nacional de vigilância sanitária, abrangendo as diversas etapas que envolvem o processo de aprovação de novos medicamentos e da sua disponibilização aos consumidores, enfatizando a importância do controle regulatório como proteção ao ser humano (Política regulatória das boas práticas de fabricação como mecanismo de garantia de qualidade e segurança dos medicamentos no brasil);
g) Da natureza extrafiscal do ICMS e seu uso como instrumento para incentivar ou desestimular o consumo a fim de defender a modulação da sua alíquota como mecanismo de política pública para assegurar melhor acesso a produtos essenciais e combater a desigualdade (Princípio da seletividade no ICMS com aplicação ao gás liquefeito de petróleo: uma análise da importância para a redução das desigualdades sociais).
Em seu conjunto, os artigos que compõem esta coletânea abarcam inúmeras questões essenciais ao estudo do Direito e Economia e permitem aos leitores ter acesso a reflexões densas sobre problemas extremamente atuais e relevantes. Aproveitem a leitura!
Prof. Dr. Marcus Firmino Santiago
Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP
Prof.ª Dr.ª Verônica Lagassi
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ
Nota técnica: Os artigos do Grupo de Trabalho Transformações na Ordem Social e Econômica e Regulação apresentados no II Encontro Virtual do CONPEDI e que não constam nestes Anais, foram selecionados para publicação na Plataforma Index Law Journals (https://www.indexlaw.org/), conforme previsto no item 7.1 do edital do Evento, e podem ser encontrados na Revista Brasileira de Filosofia do Direito. Equipe Editorial Index Law Journal - publicacao@conpedi.org.br.
ISBN: 978-65-5648-243-9
Trabalhos publicados neste livro: