V ENCONTRO INTERNACIONAL DO CONPEDI MONTEVIDÉU – URUGUAI

FILOSOFIA DO DIREITO

Estes textos reunem as apresentações dos textos em três GTs , 38. Cátedra Luís Alberto Warat, Hermenêutica jurídica e Filosofia do direito.

Os primeiros textos se referem ao pensamento de Luis Alberto Warat, que critica a dogmática jurídica, por somente recorrer a valores consagrados no passado, para tomar de decisões no presente. Deste modo, o Direito não permite facilmente o tratamento dos conflitos fora do Estado. A proposta de Warat surgiu como uma nova perspectiva para a abertura do sistema do Direito, desde meados dos anos 1970, investigando a partir da semiologia jurídica. Luis Alberto Warat, em sua trajetória intelectual, percorreu esse caminho da linguagem, chegando à conclusão de que a linguagem signo, desde autores como Roland Barthes, teria sentido graças ao denominado prazer do texto. Ou seja, o sentido estrutural dado por Saussure precisava abrir-se para o desejo. Aparece facilmente nessa etapa a contribuição de Lacan, mais tarde de Foucault para a interpretação da alma humana. Freud iniciou a psicanálise recolocando o desejo, e a sexualidade, em seu devido lugar. Mas, Lacan foi quem colocou a linguagem como condição de acesso ao inconsciente. Warat percebeu desde logo, o delírio como condição de sentido superior à linguística para a compreensão do não dito. Com o livro O anti-Édipo, Guattari, auxiliado por Deleuze, motivou Warat a colocar o corpo como complemento necessário, ou mesmo central para a construção de uma sociedade mais solidária . O texto da linguística adquire um novo olhar desde o simbólico: signo, significante, corpo.

A sociedade tem nesta observação como constituinte relações e enfrentamentos entre corpos desejantes de poder e afetos, fazendo com que hajam incompatibilidades comunicativas sem fim. No Direito, para Warat, o procedimento para o tratamento destas questões poderia seguir o caminho da mediação.

A Hermenêutica Jurídica e Filosofia do Direito foram com perspicácia abordados nos demais texto. A Hermenêutica é hoje uma derivação crítica da filosofia analítica, baseada nos trabalhos de Wittgenstein (1979) que redefiniu, em meados do século passado, a ênfase no rigor e na pureza lingüística por abordagens que privilegiam os contextos e funções das imprecisões dos discursos. A hermenêutica, diferentemente, da pragmática, centrada nos procedimentos e práticas sociais, preocupa-se com a interpretação dos textos.

No terreno jurídico a grande contribuição é portanto do positivismo de Hart (1986) e seus polemizadores como Raz (2012) e Dworkin (1986) . O positivismo jurídico inglês foi delimitado por Austin e alçado até a filosofia política através do utilitarismo de Bentham (1973). Na teoria de Hart, leitor de Bentham, a dinâmica das normas somente pode ser explicitada através da análise das chamadas regras secundárias (adjudicação, mudança e reconhecimento), que permitem a justificação e existência do sistema jurídico. Hart preocupa-se com a questão das definições. Porém, inserindo-se na concepção pragmática da linguagem, com objetivos hermenêuticos, entende que o modo tradicional de definição por gênero e diferença específica é inapropriado para a compreensão de noções tão gerais e abstratas. Pois, tais definições necessitam de termos tão ambíguos quanto os que se deseja definir. Para Hart, Direito é uma expressão familiar que empregamos na prática jurídica sem a necessidade de nenhuma definição filosófica. Assim, a preocupação da “jurisprudência” não é a explicitação da designação pura do signo direito, como tenta fazer Bobbio, mas "explorar as relações essenciais que existem entre o direito e a moralidade, a força e a sociedade (...). Na realidade, ela consiste em explorar a natureza de uma importante instituição social” (HART, 1986).

A tese do Direito como instituição social significa que o Direito é um fenômeno cultural constituído pela linguagem. Por isso, é que Hart (1986), desde a linguística, pretende privilegiar o uso da linguagem normativa como o segredo para que se compreenda a normatividade do Direito. Esta atitude epistemológica tem, para Raz (2012), duas consequências: “em primeiro lugar, os termos e expressões mais gerais empregadas no discurso jurídico (...), não são especificamente jurídicos. São, geralmente, o meio corrente mediante o qual se manifesta a maior parte do discurso normativo”. Em segundo lugar, com a análise da linguagem:

a normatividade do direito é explicada conforme a maneira como afeta aqueles que se consideram a si mesmos como sujeitos de direito. Um dos temas principais tratados por Hart é o fato de que quando uma pessoa diz ‘tenho o dever de...’ ou ‘você tem o dever de...’, ela expressa o seu reconhecimento e respalda um ‘standard’ de conduta que é adotado como um guia de comportamento (RAZ, 2012).

Isto expressa um reconhecimento de quem formula a regra, seu desejo de ser guiado por ela, e a exigência (social) de que outros também o sejam. A normatividade é social. A necessidade do reconhecimento é que colocou a teoria de Hart no centro da hermenêutica. Nessa lógica, não é surpreendente o fato que, para Hart, o Direito possui uma zona de textura aberta que permite a livre manifestação do poder discricionário do juiz para a solução dos conflitos, nos chamados hard cases.

Esta última postura é criticada por Ronald Dworkin (1986) que entende que o Direito sempre proporciona uma “boa resposta”, já que o juiz ao julgar escreve a continuidade de uma história. Neste sentido Dworkin coloca a célebre metáfora do romance escrito em continuidade, como “Narração”. A “boa resposta” seria aquela que resolvesse melhor à dupla exigência que se impõe ao juiz, ou seja, fazer com que a decisão se harmonize o melhor possível com a jurisprudência anterior e ao mesmo tempo a atualize (justifique) conforme a moral política da comunidade.

Neste sentido, apesar das diferenças, Hart e Dworkin percebem que o Direito tem necessariamente contatos com as ideias de moral e a justiça. Daí o lado moralista do Direito anglo-saxão, sempre ligado ao liberalismo, embora na versão crítica destes autores: Hart influenciado pelo utilitarismo de Bentham, e Dworkin pelo neocontratualismo de Rawls (1980).

A concepção de Estado da Hermenêutica é portanto mais atual que a da filosofia analítica, voltando-se para as instituições sociais e abrindo-se já para o Estado interventor. Entretanto, num certo sentido, esta matriz, já bastante prescritiva, ainda é normativa (normativismo de 2º grau). Embora, possa-se dizer que Dworkin possui uma teoria da interpretação, capaz de avançar além do positivismo e do utilitarismo. Outro problema que permanece é o excessivo individualismo da hermenêutica do common law.

Por tudo isto, os nossos GTs permitiram um proficuo debate sobre as três temáticas.

Prof. Dr. Leonel Severo Rocha - UNISINOS

Prof. Dr. João Martins Bertaso - URI

Prof. Luis Meliante - UDELAR

ISBN: 978-85-5505-260-6