PROCESSO CIVIL
A presente coletânea é composta dos trabalhos aprovados, apresentados e debatidos no Grupo de Trabalho: “Processo Civil I”, no âmbito do XXIX Congresso Nacional do CONPEDI, realizado entre os dias 07 a 09 de dezembro de 2022, na cidade de Balneário Camboriú/Santa Catarina, na UNIVALI – Universidade do Vale do Itajaí, e que teve como temática central “Constitucionalismo, Desenvolvimento, Sustentabilidade e Smart Cities”.
Os trabalhos expostos desenvolveram de forma verticalizada diversas temáticas atinentes ao Direito Processual Civil, especialmente na relação dialogal com os Direitos Fundamentais e a consequente Constitucionalização do Processo Civil. As pesquisas ora apresentadas funcionam como canais indispensáveis nos debates e propostas das pendências existentes nos campos indicados e na busca de soluções efetivas para as problemáticas indicadas.
Jessé Lindoso Rodrigues e Newton Pereira Ramos Neto abordam a sistemática de precedentes, inaugurada no ordenamento jurídico brasileiro objetivando, dentre outras, solucionar os problemas atinentes à insegurança jurídica, falta de previsibilidade e estabilidade jurisdicional, notadamente frente aos litígios multitudinários. Nesse cenário, um dos principais vetores da atual codificação processual consiste na valorização de padrões decisórios vinculantes, como é o caso do incidente de resolução de demandas repetitivas. Analisam o procedimento desse incidente processual e projetam sua eficácia e utilidade a fim de conferir maior racionalidade na prestação jurisdicional e redução do acervo de processos, abordando o caso do Tribunal de Justiça do Maranhão.
Flávia Candido Da Silva e Vitória Estéfani da Silva investigam a possibilidade de efetuar o pedido de reconhecimento de usucapião pela via extrajudicial. Com o passar do tempo, o judiciário brasileiro se tornou incapaz de resolver a grande quantidade de demandas existentes e de dar uma resposta rápida aos litígios. Por isso. buscou-se a criação de formas alternativas de solução de conflitos numa tentativa de amenizar o sistema judiciário. Uma delas foi a autorização da usucapião administrativa, feita de forma extrajudicial pelos cartórios, autorizado pelo Código de Processo Civil de 2015.
Agatha Gonçalves Santana, Carla Noura Teixeira e Neila Moreira Costa refletem sobre a possibilidade jurídica de se considerar um documento assinado eletronicamente pelo devedor como título executivo extrajudicial, ausentes as assinaturas de duas testemunhas, na forma como previsto de forma literal na legislação processual vigente. Tem-se como objetivo principal demonstrar a possibilidade de se considerar a executividade do documento assinado eletronicamente dentro dos padrões de chaves ICP-Brasil, tendo em vista a presença de todos os atributos e garantias legais, partindo-se de uma análise empírica do Recurso Especial nº 1.495.920/DF de 2018 (STJ).
Bárbara Teixeira de Aragão investiga a advocacia predatória como um problema enfrentado pela Justiça brasileira em que advogados se utilizam da máquina estatal para cometer fraudes processuais e alcançar indenizações indevidas, realizando uma verdadeira aventura jurídica, esquecendo-se de seus deveres éticos e profissionais, indo de encontro ao regramento processual e ao Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil. Aludida prática tem sido repreendida pelos magistrados em todo o país, pois a judicialização predatória acarreta prejuízos sistêmicos ao Poder Judiciário e, em especial, ao direito do consumidor, visto que é a área em que a prática é mais corriqueira, além de fragilizar a classe advocatícia ferindo seus princípios éticos e morais.
Francisco Romero Junior e Pedro Henrique Marangoni alertam sobre a aplicação das medidas sub-rogatórias, coercitivas, mandamentais e indutivas que estão previstas no inciso IV do art. 139 do Código de Processo Civil de 2015, que são meios coercitivos a disposição das partes e do juiz a fim de valer as leis e decisões judiciais. Muito se preocupava com a efetividade e razoável duração do processo, assim o legislador trouxe ao novo Código Processual uma ampliação dos poderes do juiz, de modo a impor uma medida desfavorável ao sujeito para que este cumpra a obrigação de maneira célere e que este ato alcance efetivamente o cumprimento da decisão obtendo um resultado igual ou equivalente.
Josyane Mansano e Rogerio Mollica tratam do contexto atinente ao princípio da motivação e da atual configuração deste no cenário jurídico, demonstrando a racionalidade das decisões judiciais face ao sistema de precedentes em temas que são vistos como sensíveis, examinando-se o enfrentamento estabelecido entre a obrigatoriedade dos mesmos e a criatividade decisória do juiz. A partir de uma análise empírica do Relatório “Justiça em Números”, realizado pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, com publicação em 2021, referentes ao ano-exercício 2020, constata-se que o sistema de precedentes se mostra útil para os magistrados quando estes proferem sua decisão e se esse sistema, de algum modo, obsta a atuação do juiz no seu ofício. Discorre-se, também, acerca das possíveis vantagens e desvantagens advindas de um stare decisis para o ordenamento jurídico, singularmente em relação à autonomia dos magistrados brasileiros.
Guilherme Masaiti Hirata Yendo , Carlos Alberto Lunelli , Rodrigo Ichikawa Claro Silva analisam se o mecanismo de aplicação das astreintes no âmbito processual civil da França confere efetividade ao sistema de proteção ao meio ambiente que tem sido construído ao longo das últimas duas décadas naquele país europeu. A aplicação das astreintes pode conferir efetividade à tutela do bem ambiental na França, além de contribuir para a mudança do próprio perfil do processo civil francês, de uma feição privatista para uma feição publicista.
José Miguel Garcia Medina e Julia Munhoz Ribeiro propõem uma análise sistêmica dos aspectos históricos e contemporâneos que informam o instituto da coisa julgada, abordando uma atenção dogmática a assuntos ontológicos outros, tais como a aplicabilidade do encimado instituto em relação as questões prejudiciais, igualmente sobre a operabilidade do manto da coisa julgada sobre decisões interlocutórias de mérito e, por último e não menos importante, sobre a eficácia preclusiva na coisa julgada.
Pedro Henrique Marangoni, Francisco Romero Junior e Gabriel Trentini Pagnussat investigam, sob a ótica da legislação brasileira e da portuguesa, a implementação de tutelas destinadas à conservação e satisfação provisórias dos direitos, apontando pontos positivos e negativos de ambos os sistemas.
Para Victor Felipe Fernandes de Lucena e William Paiva Marques Júnior, devem ser reconhecidas as demandas estruturais do direito fundamental à saúde no contexto da pandemia da Covid-19, considerando o direito sanitário como mínimo existencial e integrante da dignidade da pessoa humana em face da teoria da reserva do possível, alegada não raras vezes pelo Estado em sua tese defensiva, constituindo-se em entrave para a sua efetivação. Nessa perspectiva, a busca pela realização desse direito tem ensejado inúmeras ações judiciais a fim de compelir o Poder Público à sua prestação, inclusive com manifestações do STF sobre o tema. No entanto, a solução para o problema estrutural da seara sanitária não reside apenas na ação do Poder Judiciário compelindo os demais órgãos a garantir o acesso dos cidadãos aos seus direitos, mas em uma macrossolução em um processo estrutural, com a possível declaração do estado de coisas inconstitucional favorecendo a realização de um diálogo institucional, uma ação conjunta e integrada de todos os poderes da República no cumprimento de um plano estratégico comum sob permanente jurisdição, objetivando solucionar, por vez, o caos estrutural em que se encontra o serviço público de saúde no Brasil.
Márcio Vander Barros De Oliveira e Carlos Marden Cabral Coutinho, a partir do método hipotético-dedutivo, abordam uma nova visão processual, que não ignore os avanços doutrinários, enxergando-se o processo e em especial a lei de Execuções Fiscais de forma constitucional e democrática, e não como mero instrumento para realização de fins estatais, no presente caso da LEF, fim este, meramente arrecadatório. Considerando que apesar da função legislativa da LEF seja a cobrança de dívidas por entes federativos, esta cobrança deve ser realizada através de um processo constitucionalmente balizado, sendo medida necessariamente urgente à própria ordem democrática, o respeito às garantias fundamentais do contribuinte.
Paulo Roberto Pegoraro Júnior e Kelly Suzana Passos de Aguiar, traçam um panorama dos honorários advocatícios sucumbenciais e sua natureza de ônus ao litigante derrotado ou expectativa de direito autônomo ao advogado da parte vencedora, bem como analisar se há possibilidade das partes disporem da verba em negócio jurídico processual sem a aquiescência do advogado.
João Paulo Kulczynski Forster e Viviane de Faria Miranda defendem que a inteligência artificial vem ganhando muito espaço em todas as áreas, mas sua inserção e utilização no Poder Judiciário não pode ocorrer sem a sua compatibilização com os direitos humanos processuais, dentre os quais se destaca o direito à fundamentação que, no Brasil, também é um Direito Fundamental. A busca da inovação, refletida em dezenas de iniciativas de uso da inteligência artificial no Poder Judiciário, deve se dar sempre sob a ótica dos direitos das partes envolvidas. A análise da matéria, efetuada através de pesquisa bibliográfica, conta com abordagem da legislação brasileira e da Convenção Americana de Direitos Humanos, bem como da jurisprudência pertinente.
Denise Pineli Chaveiro , Karla Vaz Fernandes e Maria Izabel de Melo Oliveira dos Santos consideram que a legislação que antecedeu ao atual Código de Processo Civil tratou de forma detalhada sobre as medidas judicias possíveis no processo executivo. Com as reformas processuais ocorridas após a Constituição de 1988, em especial nos anos de 2015 e 2016, o sistema legal foi se encaminhando para a atipicidade dos meios executivos, e com a aprovação do novo Código de Processo Civil em 2015 o poder geral dos magistrados ganha contornos ainda mais amplos, para permitir e ampliar o uso de medidas judiciais atípicas mesmo para o exercício da função jurisdicional executiva que busca o pagamento de quantia. O inciso IV do artigo 139, amplia possibilidades, mas também traz inquietações. Se de um lado é necessário proteger o cidadão do arbítrio do Estado, de outro temos o credor, de quem foi retirado o poder de autotutela para solução dos conflitos, assim é preciso lhe garantir o direito fundamental a uma prestação judicial efetiva compatível com o princípio da menor onerosidade ao executado.
Paulo Reneu Simões dos Santos , Marcelo Moço Corrêa , Kelly Suzana Passos de Aguiar constatam a possibilidade de realizar um negócio jurídico processual no âmbito da Administração Pública, especificamente no que tange ao estabelecimento de cláusulas processuais em sede de Acordo de Não Persecução Cível. Para tanto, a temática aborda a consensualidade consubstanciada na superação do formalismo processual, a qual possibilita às partes inclusive a Administração Pública a celebrar negócios jurídicos típicos e atípicos. Na sequência será elencado o instituto do Negócio Jurídico Processual, seus requisitos para existência e validade do ato, considerando que se trata de um instituto complexo que abarca questões de direito material e processual civil, bem como temas de Direito Administrativo.
Paulo Roberto Pegoraro Júnior e Adauto Couto revelam a Teoria Geral do Garantismo proposta por Luigi Ferrajoli como um expoente na busca pela preservação dos direitos fundamentais. A intensificação da prática de atos processuais remotos, sobretudo durante a pandemia da COVID-19, tem um relevante papel de inovação no processo, mas exige uma análise quanto aos direitos processuais fundamentais, em especial a produção da prova, o contraditório e a valoração da prova. É nesse contexto que se insere o Garantismo na perspectiva digital, devido às peculiaridades dos atos remotos, que podem exigir uma nova abordagem das garantias processuais ou mesmo a criação de novos direitos voltados a atender as especificidades dos atos processuais praticados no ambiente virtual. A valoração dos atos e provas pelo julgador, terá papel ainda mais relevante frente aos desafios da virtualização dos atos processuais, de modo que não sobrevenha qualquer prejuízo às partes.
Thomás Henrique Welter Ledesma e Gabriel Pessotti da Silva desenvolvem pesquisa em torno da aplicação dos efeitos da coisa julgada às ações de controle de constitucionalidade, notadamente em razão da utilização, pelo Supremo Tribunal Federal, da teoria da abstrativização do controle difuso, que consiste em estender os efeitos do controle concentrado de constitucionalidade ao controle difuso, modificando sua vinculação, eficácia temporal e extensão.
Josyane Mansano e Rogerio Mollica investigam a possibilidade de aplicação da totalidade dos precedentes judiciais introduzidos pelo Código de Processo Civil de 2015 como forma de se promover a segurança das relações jurídicas. Com o objetivo de encontrar respostas para o tema, foi realizada, primeiramente, uma análise teórica com uma leitura, análise e objetivos do art. 927, do CPC/2015. Posteriormente, buscou-se uma padronização decisória para aplicação do art. 311, II, do CPC, ademais, foi feito um parâmetro com a utilização de precedentes do art. 927, com foco em circunstâncias de abreviação procedimental, assim como dos art. 332 e 1.032, do CPC, como proposta de padronizar o uso dos precedentes em todas as situações em que tal emprego suscita decisão liminar, a exemplo do inciso II, do art. 311, do CPC.
Victor Felipe Fernandes De Lucena e William Paiva Marques Júnior aquilatam os precedentes judiciais e a importância do dever de fundamentação das decisões judiciais para o Estado Democrático de Direito, especialmente a relevância do art. 489, §1º, incisos V e VI da Lei nº 13.105/15, os quais regram os critérios mínimos para uma decisão judicial adequadamente fundamentada, considerando a vinculação dos precedentes no atual sistema processual brasileiro, devendo o órgão julgador observá-los nos casos semelhantes, sob pena de se constituir em falsa fundamentação. A relevância do tema possui origem constitucional, posto que o dever de fundamentação das decisões está expressamente previsto no art. 93, inciso IX da Constituição Federal de 1988, sendo um corolário fundamental para a observância da segurança jurídica e do devido processo legal, no contexto da democratização do Direito Processual Civil.
Saulo Capelari Júnior, Liège Novaes Marques Nogueira e Silvana Aparecida Plastina Cardoso abordam as discussões que permeiam os instrumentos probatórios na Era Digital, surgindo como problemática central da presente pesquisa o debate em torno da validade dos Prints de WhatsApp como meios de prova no contexto das inovações tecnológicas tem se apresentado como instrumentos de transformação do meio.
Com grande satisfação os coordenadores apresentam a presente obra, agradecendo aos autores/pesquisadores envolvidos em sua produção pelas profícuas reflexões surgidas e debatidas, bem como reiteram e louvam a dedicação e competência de toda a equipe do CONPEDI pela organização e realização do exitoso e arrojado evento, realizado em Balneário Camboriú/Santa Catarina.
Reiteramos a esperança que a obra ora apresentada sirva como parâmetro acadêmico para a compreensão dos problemas da complexa realidade social sob a óptica processual civil. Desejamos leituras proveitosas na construção de uma nova perspectiva para os desafios impostos ao Direito Processual Civil no contexto contemporâneo pós-pandêmico de utilização dos mecanismos dos Direitos Fundamentais como força motriz da constitucionalização processual.
Profa. Dra. Cláudia Franco Corrêa - Universidade Veiga de Almeida/Rio de Janeiro
Prof. Dr. Rogerio Borba- UNIFACVEST/Santa Catarina
Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior- UFC (Universidade Federal do Ceará)
ISBN: 978-65-5648-605-5
Trabalhos publicados neste livro: