FORMAS CONSENSUAIS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS I
O livro que ora se apresenta é fruto dos artigos debatidos no Grupo de Trabalho intitulado Formas Consensuais de Solução de Conflitos I, por ocasião do XXIX Congresso Nacional do Conpedi, realizado no Campus da prestigiada Universidade do Vale do Itajaí, em Balneário Camboriú, Santa Catarina. Os textos, que se encontram identificados por título e extrato de conteúdo, demonstram o quão desenvolvidas se encontram as discussões de um tema que, outrora incipiente, vem ganhando espaço na academia e nas práticas institucionais. São os seguintes os capítulos que compõem o livro:
1- "A CELEBRAÇÃO DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA NO ÂMBITO DAS AÇÕES DE IMPROBIDADE COMO FORMA DE ATRIBUIR EFICIÊNCIA A ATUAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA": Trata-se de estudo destinado a analisar a possibilidade de atuação da Administração Pública por meios consensuais, bem como as diretrizes atinentes da nova Lei de Improbidade Administrativa – Lei Federal n.º 14.230, de 25 de outubro de 2021, em especial no tocante ao disposto no artigo 17-B, que se refere à celebração de acordo de não persecução civil entre o réu e o Ministério Público, assegurados os princípios institutivos da isonomia (artigo 5º, caput, da CR/88), da ampla defesa e do contraditório (artigo 5º, inciso LV, da CR/88), em atenção à efetiva participação dos envolvidos no termo de acordo. O texto também questiona se a realização de termo de ajustamento de conduta no âmbito das ações de improbidade pode ser caracterizada como uma forma de atribuir eficiência à atividade administrativa.
2- "A CONSENSUALIDADE NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA A PARTIR DA SOCIOLOGIA REFLEXIVA DE PIERRE BOURDIEU: PERSPECTIVAS E DESAFIOS" Nesse artigo aborda-se, a partir da perspectiva da sociologia reflexiva de Pierre Bourdieu, a ruptura do paradigma tradicional da Administração Pública e a implementação dos mecanismos de resolução consensual de conflitos no campo burocrático. Por conseguinte, questiona-se: de que forma a ruptura do paradigma tradicional da Administração Pública pode contribuir para a implementação dos meios adequados de resolução de conflitos no âmbito administrativo? O objetivo geral da pesquisa é analisar de que modo tal mudança pode contribuir para a implementação da resolução consensual de conflitos envolvendo a Administração Pública. Para tanto, busca-se: a) investigar de que maneira se estabelece o campo e o habitus burocráticos da Administração Pública; b) averiguar a modificação do paradigma tradicional administrativo; e c) perquirir a nova postura consensual adotada pelo Poder Público no contexto da gestão adequada de conflitos.
3- "A DESJUDICIALIAÇÃO DOS CONFLITOS EMPRESARIAIS SOB O VIÉS DA NEGOCIAÇÃO COLABORATIVA: INTERFACES ENTRE O DIREITO E A ECONOMIA EM PROL DA RESPONSABILIDADE SOCIAL". Nesse trabalho, analisa-se a técnica da negociação colaborativa como instrumento adequado na desjudicialização de conflitos empresariais, a partir de uma relação entre o direito e a economia em favor da responsabilidade social. Para tanto, em que medida a negociação colaborativa pode contribuir como técnica adequada de resolução de disputas empresariais sob uma perspectiva da análise econômica do direito em prol da responsabilidade social? Inicialmente, discorre-se sobre a desjudicialização, e, em ato subsequente, desenvolve-se aportes teóricos sobre a negociação, com enfoque na negociação colaborativa. Ato contínuo, objetiva-se estabelecer interfaces entre a economia e o direito sob uma visão na negociação colaborativa, para então adentrar nos benefícios da técnica colaborativa nas atividades empresariais em prol da responsabilidade social. Conclui-se que a negociação colaborativa nos conflitos empresariais, sobre uma análise de custo-benefício, se sobrepõe de forma positiva em relação a rotineira solução judicial, pelo simples fato dos custos do processo judicial, aliado ao tempo e risco (incertezas) do processo. A contribuição para a responsabilidade social é reflexa, na justificativa de manutenção da relação negocial entre os envolvidos, permanência da cadeia produtiva, o que contribui indiretamente para a subsistência de todos os envolvidos na manutenção da atividade empresarial, atendendo aos propósitos de uma empresa cidadã, comprometida ao cumprimento dos anseios constitucionais da dignidade da pessoa humana.
4- "A MEDIAÇÃO COMO FORMA DE ACESSO À JUSTIÇA À LUZ DO OBJETIVO 16 DA AGENDA 2030 DA ONU". O estudo tem como objetivo explorar a mediação como uma das formas de acesso à justiça, atendendo às diretrizes do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 16 da Agenda 2030 da ONU, o qual se propõe a buscar a paz, a justiça e o funcionamento eficaz das instituições. Diante do novo paradigma da sustentabilidade e da complexidade dos conflitos sociais, o Poder Judiciário deve recorrer a alternativas eficazes, através da implementação de métodos adequados de solução de conflitos, no sentido de garantir o acesso à justiça, sem nenhuma discriminação, para que se construa uma sociedade pacífica, com respeito às pessoas de forma igualitária. Analisa-se que a mediação é uma das formas que possibilitam a resolução destes conflitos por meio de um processo democrático constitucional-deliberativo que incentiva regras da intervenção mínima do Estado e de cooperação entre as partes, de modo a ressignificar esses antagonismos, a fim de que sejam vistos sob uma ótica positiva.
5- "A POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NOS CRIMES DE LESÃO CORPORAL CULPOSA DECORRENTES DO ERRO MÉDICO E OS DESAFIOS DECORRENTES DA RUPTURA DA CONFIANÇA NA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE". As ações penais decorrentes de erro médico têm aumentado gradativamente, ocasionando processos longos e dolorosos para as partes envolvidas. Sendo assim, busca-se novas maneiras de solucionar tais conflitos, mas que permitam às partes a compreensão dos atos praticados e suas consequências. Dessa forma, discute-se a possibilidade de aplicação da Justiça Restaurativa aos crimes de lesão corporal culposa ocasionados por erro médico, como forma de reconhecimento dos danos provocados e revaloração das partes. Entretanto, exsurge a seguinte pergunta: é possível aplicar a Justiça Restaurativa, verificando-se a voluntariedade das partes diante da quebra de confiança na relação médico-paciente e a diferença de conhecimento técnico entre autor e vítima? Para responder a presente pergunta orientadora, buscou-se discutir a diferença entre erro médico e iatrogenia, a Justiça Restaurativa como via alternativa e autônoma na resolução do conflito penal para, ao final, verificar se é possível, de fato, permitir o diálogo informado entre o médico e o paciente através dos círculos restaurativos, preservando-se os direitos fundamentais das partes e as consequências em eventual ação penal pública.
6- "A REGULARIZAÇÃO DE IMÓVEIS POR VIA DA USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL – MANUAL PRÁTICO". O ordenamento jurídico brasileiro assegura o direito de propriedade e esta deve cumprir sua função social. Este direito não é automático ao cidadão, ainda que tenha exercido a posse, por longo tempo, de forma mansa e pacífica sobre um imóvel. Mas tal direito pode ser efetivado pelo cidadão, por via do instrumento da usucapião. O processo judicial da usucapião, porém, é desnecessariamente burocratizado, afastando o cidadão comum de seu direito de propriedade. Uma alternativa mais adequada seria o procedimento da usucapião extrajudicial, prevista no artigo 216-A da Lei 6.015/73 - Lei de Registros Públicos e regulamentada pelo Provimento 65/2017 do Conselho Nacional de Justiça. Este caminho, porém, é desconhecido das pessoas, impedindo o exercício de seu direito à aquisição da propriedade pelo instituto da usucapião. Assim, o objetivo do trabalho é a elaboração de um manual prático para otimizar o procedimento da usucapião pela via extrajudicial, permitindo que os cidadãos possam regularizar seu imóvel de uma forma mais efetiva, menos onerosa e burocrática. Espera-se, como resultado do trabalho, demonstrar a celeridade do instituto da usucapião extrajudicial por simplificação da regularização fundiária e que o manual prático resultante possa constituir-se em um efetivo instrumento de trabalho dos operadores do direito.
7- "A UTILIZAÇÃO DA CONCILIAÇÃO NO PROCEDIMENTO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS DECORRENTES DO SUPERENDIVIDAMENTO: OS REFLEXOS SOCIOJURÍDICOS DA LEI Nº 14.181/21". Esse texto tem como objetivo apresentar reflexões acerca do fenômeno do superendividamento e da relevância da conciliação no procedimento de repactuação de dívidas, enunciando os reflexos sociojurídicos trazidos pela Lei nº 14.181/2021. Constata-se, com o estudo, que a sociedade de consumo e a pandemia causada pela COVID-19 contribuíram para o aumento das situações de superendividamento. Verifica-se, também, que o meio autocompositivo viabilizado pela conciliação na Lei nº 14.181/2021 assegura aos cidadãos superendividados um amplo acesso à justiça, sob a perspectiva da Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesse, com ênfase no respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana e da preservação do mínimo existencial. Certifica-se, por fim, que as proteções sociais e regulamentações fomentadas não se destinam somente à proteção do consumidor, mas também à sustentabilidade das relações econômicas defendida e regulada pela ordem econômica por meio das previsões constitucionais.
8- "AMEAÇA À EQUIDADE DE GÊNERO: QUANDO A MEDIAÇÃO E A CONSTELAÇÃO FAMILIAR SE ENCONTRAM PARA A RESOLUÇÃO DE CONFLITOS EM CASOS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER". O trabalho explora o tema da mediação institucionalizada de conflitos para casos de violência contra a mulher. Parte do problema da compatibilidade desta forma de resolver controvérsias em situações de desigualdades crônicas, como as vivenciadas pelas mulheres brasileiras. Desenvolve-se a partir de uma leitura crítica sobre a implementação da política judiciária instituída pela resolução 125/2010 do CNJ e seu incentivo de uma cultura da paz e sobre a disposição da Política Nacional de Justiça Restaurativa por meio da resolução 225/2016 do CNJ. Tem-se objetivo geral analisar se o discurso pela harmonia nas relações interpessoais não mascara e reproduz as hierarquias inerentes às relações de gênero, levanta como hipótese central a de que o avanço quanto à admissão de novas juridicidades não é capaz de eliminar a revitimização das vítimas de violência e peca pela adoção de mecanismos pautados pela pseudociência. Como objetivos específicos explora o desenvolvimento da adoção dos métodos autocompositivos pelo Judiciário brasileiro e a implementação dos centros judiciários de solução de conflitos e cidadania, além de levantar a literatura jurídica que une a reflexão sobre gênero e métodos adequados de solução de conflitos, como é o caso da justiça restaurativa e o uso da chamada constelação familiar. Conclui-se que a reprivatização da violência contra a mulher pelo uso da mediação e da constelação familiar se choca com a busca plena por uma justiça de gênero.
9-" ARBITRAGEM E AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO: A RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NA ERA DIGITAL". O objetivo do trabalhoé analisar a arbitragem nos processos jurídicos em relação às novas tecnologias digitais, em especial, os Smart Contracts (contratos inteligentes), o Blockchain (livro-razão) e o Metaverso (internet 3D) – um espaço-tempo virtual, imersivo, interativo, coletivo e hiper-realista –, que, de acordo com especialista de grandes conglomerados de tecnologia, representa o próximo estágio da internet. Significa que a internet ampliará a interatividade, para tornar-se uma espécie de meio termo entre a vida real e a vida virtual do indivíduo, por meio da tecnologia 3D, que cria ambientes específicos para que os usuários possam conviver e interagir entre eles. Deste modo, questiona-se o método tradicional de arbitragem em face dos novos entendimentos, e do surgimento de plataformas digitais, que se utilizam destes recursos para melhor atender as perspectivas de fazer valer a justiça, na era digital. A pesquisa intenta, portanto, apresentar a total aplicabilidade destes instrumentos tecnológicos na dissolução de controvérsias extrajudiciais, conceituando o “processo arbitral”, a “cláusula arbitral”, as novas tecnologias e sua empregabilidade. Para esse fim, busca-se investigar os efeitos econômicos e sociais que as novas tecnologias podem proporcionar, principalmente nos quesitos de segurança, celeridade, praticidade e economicidade, requisitos essenciais ao processo arbitral.
10- "DA NECESSIDADE DE (RE)PENSAR O DIREITO FUNDAMENTAL AO ACESSO À JUSTIÇA E PROMOVER O ACESSO À ORDEM JURÍDICA JUSTA". O trabalho investiga o estado atual do direito fundamental ao acesso à justiça no Brasil e analisa quais instrumentos podem reforçar sua efetividade. Para tanto, averigua-se o seu aspecto conceitual e como seu significado evoluiu ao longo do tempo, os números da justiça brasileira no ano de 2021, traçando um paralelo em relação ao cenário mundial e os reflexos desses dados obtidos em relação ao acesso à justiça e à sua finalidade maior, de assegurar direitos fundamentais às pessoas. Conclui-se que ainda há muito a ser feito no Brasil para efetivar o direito fundamental de acesso à justiça e os direitos que por ele podem ser assegurados, ante à infinidade de ações ajuizadas todos os anos e a incompatibilidade dessa demanda com as possibilidades humanas do Poder Judiciário. Ao final, propõe-se repensar o acesso à justiça e elenca-se instrumentos jurídicos aptos a proporcionar uma ampliação ao acesso a uma ordem jurídica justa.
11- "GESTÃO DE CONFLITOS PARA ALÉM DA VIA JUDICIAL: CONSIDERAÇÕES E REFLEXÃO". O texto trata dos meios de resolução dos conflitos para além da órbita da decisão judicial – como, vg, podem ser os expedientes de conciliação, mediação e a arbitragem - e sua aplicabilidade no cotidiano dos cidadãos, bem assim a forma como essas práticas são vistas pelos profissionais do Direito e pelos próprios possíveis usuários. Procura-se fazer breve análise dos métodos consensuais de solução de conflitos por meio de interferências extrajudiciais e como, efetiva e tecnicamente, estas podem operar na construção de uma sociedade menos violenta, sem esquecer as dificuldades e a resistência encontradas para sua concretização de fato, bem assim o contexto social e econômico que se coloca como base de atuação do terceiro imparcial, solucionador do conflito. Com efeito, conclui-se que os métodos de autocomposição e os meios alternativos adequados a resolução de conflitos, sozinhos, não vão conseguir acabar com a crise enfrentada pelo Poder Judiciário brasileiro, porquanto para que se diminua o número de processos novos e em trâmite na Justiça brasileira, faz-se necessário, inicialmente, uma mudança na mentalidade dos operadores do direito, bem como dos litigantes, com o intuito de se alterar a cultura da litigiosidade e buscar a pacificação social.
Apresentados os temas do livro, o leitor perceberá o quão ecléticos são e, principalmente, o compromisso de cada um dos autores em problematizar as questões afetas ao tema nuclear consistente nas formas consensuais de solução de conflitos. Muito ainda há de ser feito e construído, porém o caminho encontra-se pavimentado e os frutos, por certo, serão percebidos. O horizonte é promissor!
Ótima leitura a todos, é o que desejam os organizadores!
Balneário Camboriú, primavera de 2022.
Gabriel Antinolfi Divan - Universidade de Passo Fundo - RS. Email: divan.gabriel@gmail.com
Raymundo Juliano Feitosa - Universidade Católica de Pernambuco. Email: raymundojf@gmail.com
Luiz Gustavo Gonçalves Ribeiro- Escola Superior Dom Helder Câmara. Email: lgribeirobh@gmail.com
ISBN: 978-65-5648-614-7
Trabalhos publicados neste livro: