XXIX CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI BALNEÁRIO CAMBORIU - SC

CRIMINOLOGIAS E POLÍTICA CRIMINAL I

Passados dois difíceis anos de Pandemia e Eventos Virtuais, em dezembro de 2022, na cidade de Balneário Camboriú, o Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Direito retoma os eventos presenciais com o XXIX Congresso Nacional, desta vez, organizado pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

O Grupo de Pesquisa “CRIMINOLOGIAS E POLÍTICA CRIMINAL I” ocorreu na tarde do dia 09/12, e contou com a apresentação de 12 (doze) trabalhos, os quais oportunizaram discussões de ordem criminológica e político-criminal que geraram contundentes interrogantes, críticas e, ainda, de aspectos propositivos.

O primeiro trabalho a ser apresentado foi “AS MASMORRAS DO SÉCULO XXI E AS FACÇÕES CRIMINOSAS: O INÓSPITO E DEGRADANTE SÓCIO AMBIENTE PRISIONAL BRASILEIRO COMO UMA DAS RAZÕES DO NASCIMENTO E CRESCIMENTO DOS GRUPOS FACCIONAIS”, de autoria de Luan Fernando Dias. A pesquisa, que traz uma radiografia do Sistema Prisional Brasileiro, mostra um ambiente que, muito além de privar a liberdade (consectário esperado da pena), relega os apenados a condições indignas e desumanizantes, o que proporciona novas formas de sociabilidade entre presos, e também, a novos modos de regulação do espaço da prisão que, a partir daí, do intramuros transbordam para o mundo externo.

Também versando acerca do universo prisional, a segunda pesquisa, agora de tema “HABITAÇÃO SOCIAL E SUSTENTABILIDADE AO EGRESSO: IMPACTOS E CONSEQUÊNCIAS NO CONTEXTO DA REINCIDÊNCIA CRIMINAL”, fora apresentada pelos autores Marcelo Coelho Souza, Maria Claudia da Silva Antunes de Souza e Airto Chaves Junior. Partindo-se da premissa de que o cárcere acaba por devolver à sociedade indivíduos ainda mais propensos a cometer crimes (efeito regurgitante), os autores procuraram demonstrar que Políticas habitacionais voltadas ao egresso podem contribuir para a redução dos fatores criminógenos suportados por aquele que viveu no ambiente intramuros e, por consequência, apresentar benefícios na redução dos índices de reincidência penal.

A terceira pesquisa, de autoria dos pesquisadores Vinny Pellegrino Pedro e Antonio José Fernandes Vieira, trata dos “IMPACTOS ECONÔMICOS DA GUERRA ÀS DROGAS NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO”. O texto propõe o aperfeiçoamento da Lei nº 11.343/2006, sobretudo no que se refere aos critérios (subjetivos) para se determinar se o sujeito que é surpreendido na posse de drogas o faz para o consumo próprio (usuário) ou para o tráfico clandestino (traficante). Neste ínterim, a proposta é que, no plano legal, estabeleçam-se critérios objetivos de diferenciação, e cujo porte levasse à presunção de destinação para consumo pessoal.

“POLÍTICA CRIMINAL E JANELAS QUEBRADAS: RUÍNA DEMOCRÁTICA FRENTE O PUNITIVISMO”, de autoria de Cezar Cardoso de Souza Neto, Maria Rafaela Junqueira Bruno Rodrigues e Gabriel Menezes Horiquini, foi o quarto trabalho apresentado no Grupo de Pesquisa. O estudo procura realizar um paralelo entre Estados Unidos da América e Brasil baseado no surgimento da popular política de tolerância zero (pautada pela teoria das janelas quebradas), bem como no desenvolvimento do Estado detentor do ideal máximo de segurança. Ao final, como proposta de superação desse quadro, discorre a necessidade da criação de soluções estruturais capazes de suplantar a lógica de responsabilização individual no cidadão.

O quinto trabalho, produzido e apresentado por Tiago Olympio Spezzatto, recebeu o título “O EMPREENDEDOR MORAL NAS REDES SOCIAS: AÇÃO PERSUCUTÓRIA E LINCHAMENTOS VIRTUAIS”. A pesquisa procura trazer características da comunicação nas redes sociais e identificar o modo de atuação de alguns de seus comunicadores, os “comentaristas das redes”, relacionando-os ao conceito de empreendedor moral desenvolvido por Howard Becker. A partir disso, analisa de que modo essa ação pode culminar nos chamados linchamentos virtuais. Em interessante articulação, os resultados apresentados pelo autor vão no seguinte sentido: a forma de comunicação nas redes sociais facilita a atuação dos chamados empreendedores morais, que agem combinando interesses morais, econômicos e pessoais, com o afã de impor seus valores de mundo. O sucesso da empreitada moral pode resultar nos chamados linchamentos virtuais.

Deborah Soares Dallemole e Ana Paula Motta Costa são as autoras da sexta pesquisa apresentada neste Grupo de Trabalho. Sob o título “DIREITO DE DEFESA NAS INSTITUIÇÕES SOCIOEDUCATIVAS: DESAFIOS DA REALIDADE”, o estudo procura analisar as condições de exercício do direito de defesa nas unidades de cumprimento de medida socioeducativa de internação no Brasil, em especial quanto à existência de uma cultura de atuação da defesa técnica nos procedimentos administrativos disciplinares. Demonstra que o defensor do adolescente (no âmbito do procedimento contra o menor instaurado) surge como um terceiro, do mundo exterior à instituição, capaz de trazer ao procedimento a versão dos fatos do adolescente, em linguagem técnica. É a pessoa que não está imediatamente inserida na relação institucional de grupos de internos e grupos de supervisão, e que, também, não está sujeita ao código disciplinar da instituição e, portanto, ao menos em alguma medida, seu comportamento não é foco da ação normalizadora institucional.

O sétimo trabalho, de título “POPULISMO PENAL COMO FORMA POLÍTICA DE GOVERNANÇA: RAZÕES E REFLEXOS”, é produto de pesquisa de autoria de Marina Rebello Vinotti. No estudo, a autora procura esclarecer a recorrente temática do denominado populismo penal na cultura democrática brasileira, sobretudo, o uso do Direito Penal como instrumento de propaganda política dos candidatos na tentativa de angariar votos. Ao final, demonstra as principais características dessa instrumentalização do Direito Penal, especialmente no que toca a inflação legislativa neste campo, gerando criminalização e, por consequência, aumento da massa carcerária.

A pesquisa de autoria de Guilherme Cardoso Antunes da Cunha, Paulo Agne Fayet de Souza e Isabel Pires Trevisan foi o oitavo artigo apresentado. “A ATUAÇÃO POLICIAL E A PROIBIÇÃO DA TORTURA” objetiva realizar um paralelo entre as práticas de tortura exercidas pelas agências de polícia no Brasil e o chamada “uso moderado da força” empregado por essas agências no contexto regular de suas atividades.

A nona pesquisa, de tema “A SELETIVIDADE PENAL E A (IN)EXISTÊNCIA DE ESTEREÓTIPO CRIMINOSO BRASILEIRO”, é de autoria de Flavia Simões de Araújo, Marcos José de Jesus Porto e Tainá Simões Ruffing. Com fundamento nos estudos da Criminologia Crítica, os autores buscam analisar se o Estado brasileiro, pela via do Sistema de Justiça Criminal e dos processos de criminalização (primária e secundária) adota critérios que objetivam excluir socialmente indivíduos que integram parcelas específicas da população.

Helena Schiessl Cardoso e Jeison Giovani Heiler produziram e apresentaram o décimo trabalho do GT: “ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI NO SISTEMA DE JUSTIÇA: ENTRE RUPTURAS E PERMANÊNCIAS DA LÓGICA PUNITIVA SELETIVA”. Nele, os autores procuram compreender o funcionamento do sistema de justiça após a normatização do modelo socioeducativo de responsabilização para avaliar se a lógica punitiva foi substituída por uma lógica socioeducativa na realidade do adolescente em conflito com a lei. Ao final, concluem que a realidade do Sistema de Justiça brasileiro ainda não conseguiu acompanhar o giro linguístico proposto pela doutrina da proteção integral, permanecendo, grosso modo, a lógica retributiva e seletiva no atendimento do ato infracional no Brasil.

No décimo primeiro artigo, os autores Fábio dos Santos Gonçalves e Clarindo Epaminondas de Sá Neto questionam como uma orientação para segurança pública baseada em tendências de necropolítica afronta os princípios fundamentais constantes na Carta Magna da República Federativa do Brasil. Sob o título “CORPOS INDESEJADOS E A (IN)SEGURANÇA PÚBLICA: A POLÍTICA DA MORTE ENQUANTO MODUS FACIENDI NO ESTADO BRASILEIRO”, o texto demonstra que isso se dá das mais diversas maneiras, mas quase que sempre engendrando estratégias de criminalização de pessoas negras, ao tempo em que se opera a diminuição dos investimentos em educação e em programas sociais destinados à assistência, saúde e promoção da autonomia desses grupos de vulneráveis sociais.

A última pesquisa da tarde apresentada neste Grupo de Trabalho foi a de autoria de Eloy Pereira Lemos Junior, Deilton Ribeiro Brasil e Francys Gomes Freitas, intitulada “ASPECTOS SOCIOLÓGICOS E PONDERAÇÃO NO USO DE ALGEMAS, DIGNIDADE HUMANA E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO”. No estudo, os autores procuram analisar, à luz dos critérios de proporcionalidade, as restrições estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal para a utilização das algemas por parte das agências de Segurança Pública no contexto da edição da Súmula Vinculante nº 11.

Da análise da qualidade dos textos produzidos e apresentados, apesar da abordagem de cada pesquisa estar situada em diferentes pontos que abrangem o Sistema Penal, há plena convergência quanto ao aspecto crítico do atual quadro político-criminal brasileiro, notadamente marcado pela expansão do Direito Penal.

Por estas razões, os artigos apresentados a este Grupo de Trabalho constituem importantíssimas ferramentas para a conclusão da necessária retração do poder punitivo e desenvolvimento de soluções efetivamente humanizadas, diferentes das já comprovadamente ineficazes produzidas a partir da lógica “crime e pena”.

Desejamos a todos uma excelente leitura e que este seja apenas o ponto de partida dos qualificados debates que estão por vir.

Balneário Camboriú/SC, primavera de 2022.

Prof. Dr. Airto Chaves Junior (Universidade do Vale do Itajaí).

Prof. Dr. Dani Rudnicki (Universidade La Salle)

Prof. Dr. Gustavo Noronha de Avila (Centro de Ensino Superior de Maringá).

ISBN: 978-65-5648-658-1


Trabalhos publicados neste livro: