ACESSO À JUSTIÇA I
ACESSO À JUSTIÇA I
O acesso à justiça, para além do acesso ao judiciário, demanda a invocação de diversificadas frentes de atuação, tanto judiciais quanto extrajudiciais.
A legislação brasileira vem sendo atualizada e revisada com o propósito de acompanhamento do dinamismo e complexidades das relações sociais e dos novos modelos de configuração dos conflitos postos.
A cultura do litígio tem sido, e precisa mesmo ser, substituída pela cultura da conformação dos interesses. Conformação compreendida não no sentido de resignação, mas sim de conformidade e harmonização. Essa experiência da conformação poderá ser implementada por meio de técnicas extrajudiciais de solução de conflitos, tais como: mediação, arbitragem, negociação, etc. Todas elas refletem soluções baseadas na racionalidade, levando à emancipação dos sujeitos de direito que se empoderam de sua capacidade de construir e cumprir acordos pensados em conjunto, evitando o excesso de judicialização dos conflitos, e consequentemente, do endêmico emperramento do Poder Judiciário.
Aprender a lidar com a cultura da conformação e negociação dos conflitos é tarefa que deve iniciar-se cedo na vida das pessoas. Os professores, de um modo geral, têm um fértil campo de atuação neste sentido. Desde a escola infantil até os bancos das universidades, esse ensinamento poderá ser passado e treinado, só assim poderemos cultivar a paz nas relações sociais. De outra forma os conflitos sociais se tornarão cada vez mais complexos e demorada sua solução.
Tanto a morosidade do Judiciário na solução dos conflitos a ele denunciados, quanto a falta de politicas públicas adequadas ao atendimento das necessidades sociais, bem como a cultura do litígio encrustada no inconsciente da sociedade, constituem sérios entraves à realização do acesso à justiça social.
Lado outro não se pode negar a estreita ligação, via de regra falida, entre a concessão satisfatória dos direitos judicialmente reconhecidos e a real possibilidade de sua realização e asseguramento aos jurisdicionados. Assim é que se vê se fazerem claros os entraves políticos e econômicos à solução dos conflitos sociais, tornando, em diversas circunstâncias, as decisões judiciais inócuas e/ ou inexequíveis.
Áreas que compõem os direitos sociais constitucionais, tais como a saúde, o meio ambiente, o direito previdenciário, criança e adolescente, etc, necessitam de investimento e planejamento prévios de todos os Poderes do Estado para serem garantidos com um mínimo de segurança. Desta forma o acesso à ordem jurídica justa poderá ser alcançada e mantida, diminuindo-se, finalmente, a perniciosa tensão entre a Política e o Judiciário, garantindo-se, desta forma, o cumprimento do prometido Estado Democrático de Direito anunciado e prometido na Constituição da República de 1988.
Neste sentido, os capítulos a seguir, com seus correspondentes autores, emprestam significativa contribuição ao debate sobre o acesso à justiça, sendo possível observar as seguintes temáticas:
1ª - Acesso à justiça e teoria discursiva do direito, acesso à justiça e justiça restaurativa, e acesso à justiça e Estado Democrático de Direito. Discute-se neste eixo temático o acesso à justiça sob a ótica da teoria da ação comunicativa de Habermas, focando o direito como busca do consenso, procurando superar os tecnicismos e burocracias da razão instrumental e o resgate da razão pela via da comunicação, com o fito de construir um direito pautado pela efetiva participação social. Em perspectiva semelhante trata o capítulo que aborda a Justiça Restaurativa, a partir de análise do Projeto de Lei 7006/2006 que propõe alterações no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941, e da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, para facultar o uso de procedimentos de Justiça Restaurativa no sistema de justiça criminal, em casos de crimes e contravenções penais. O objetivo é proporcionar às partes envolvidas autonomia e efetiva participação, contando com a participação ampla da rede social para o alcance do seu desiderato, como forma de contribuir para o acesso à justiça. Num terceiro momento abordar-se a relação entre acesso à justiça e Estado Democrático de Direito, considerando posicionamentos do Poder Judiciário, partindo-se de um caso concreto envolvendo a coleta de lixo no município de Cambuquira-MG e a decisão do Tribunal determinando sua realização três vezes por semana, e destacando a participação social neste processo envolvendo a comunidade e o meio-ambiente.
2ª - Acesso à justiça e morosidade judicial, acesso à justiça e razoável duração do processo. Discute-se neste eixo temático temático os problemas da morosidade judicial na Justiça Brasileira, o congestionamento de processos, o não cumprimento do princípio da razoável duração do processo e os graves prejuízos que tal ocasiona à prestação da justiça.
3ª - Acesso à justiça e judicialização dos direitos sociais, judicialização das políticas públicas e ativismo judicial. Discute-se neste eixo o fenômeno da judicialização das políticas públicas, a relação entre o político e o jurídico na efetivação de direitos sociais fundamentais, a atuação dos tribunais e sua legitimidade em face de decisões que tem repercussão no poder político, mormente na Administração Pública, tendo em vista que o administrador público tem um orçamento previamente votado e aprovado. Aborda-se o conflito entre o princípio da "reserva do possível" e do "mínimo existencial", destacando as decisões dos tribunais nesta matéria.
4ª - Acesso à justiça e métodos alternativos de resolução de conflitos. Discute-se neste eixo temático os meios alternativos de resolução de conflitos, como mediação e conciliação, a inserção destes institutos no Novo Código de Processo Civil, e a contribuição dos meios alternativos de resolução de conflitos para a ampliação do acesso à justiça, rompendo com o paradigma do contencioso, e buscando mostrar que é possível acessar e realizar justiça sem que seja necessariamente pela vida dos tribunais.
Esperamos que todas as discussões aqui tratadas possam contribuir para ampliar a compreensão do acesso à justiça e efetivação dos direitos fundamentais sociais.
ISBN: 978-85-5505-075-6
Trabalhos publicados neste livro: