DIREITOS HUMANOS E EFETIVIDADE: FUNDAMENTAÇÃO E PROCESSOS PARTICIPATIVOS
O Grupo de Trabalho “Direitos Humanos e Efetividade: fundamentação e processo participativos” se reuniu em Salvador/BA, no XXVII Encontro Nacional do CONPEDI, para discutir a efetividade dos Direitos Humanos sob diversos prismas, desde que, comprometidos em conhecer, no tratamento das situações de dissenso ou de antagonismo de interesses, a noção programática e vivencial de Estado Democrático de Direito.
Preocupados com a significação heterogênea da expressão “Direitos Humanos”, bem como, com a falta de precisão para a determinação de seu alcance, que ocasiona, assim, fragilidades conceituais, como há muito alertou Norbeto Bobbio, os pesquisadores intentaram contribuir para estabelecer pressupostos eticamente comprometidos para a superação da vagueza da expressão ‘Direitos Humanos’, decorrente da própria ambiguidade da pergunta originária, qual seja, ‘o que são Direitos Humanos?’.
A busca às respostas, minimamente, comprometidas em reconhecer, especialmente em um cenário globalizado, que todos os seres humanos são titulares de dignidade própria, uma vez que, nascem livres, dotados de razão e titulares de direitos, como destacou o artigo primeiro da Declaração Universal, passa pelo rechaço a qualquer desvio fundamentalista, como sustenta Alain Supiot. O professor francês relembra, que a doutrina fundamentalista, surgida no final do século XIX, pode assumir três aspectos diferentes: 1) messiânico, que intenta impor ao mundo inteiro, uma única interpretação, voltada ao liberalismo teológico; 2) comunitarista, que transforma o conteúdo de Direitos Humanos em uma marca de superioridade do Ocidente, negando outras civilizações; 3) cientificismo, quando a interpretação dos Direitos Humanos se vincula a dogmas próprios da biologia ou da economia.
Em momento algum, se nega a preocupação do fundamentalismo de cariz cientificista, com defesa da liberdade ou com o direito de propriedade, porém, antes destes, devemos assegurar, como refere Supiot, um mínimo de segurança física e econômica. Ao contrário, longe destas garantias, ainda estamos presenciando agressões por parte de grupos que entendem serem superiores como raça, acarretando que, populações inteiras sofram com fome, frio, falta de moradia, etc. Hoje, por exemplo, assistimos a principal potência mundial, impor a separação de crianças de seus pais, em prol de uma política de tolerância zero com imigrantes.
Não pode haver liberdade onde reina a insegurança física ou econômica, isso porque, o conteúdo dos Direitos Humanos deve ser entendido como um recurso comum da humanidade, aberto às contribuições de todas as civilizações, de modo a permitir à humanidade, em sua infinita diversidade, a real compreensão de sua interdependência e dos valores que a unem.
A partir destes compromissos, com o olhar crítico para a segurança pública do Brasil, Emerson Francisco de Assim, investigou a justiça de transição e a violência policial como fatores que ora dialogam e ora afrontam o conteúdo dos Direitos Humanos.
Já, com o intuito de contribuir com uma fundamentação possível aos direitos sociais, André Luiz dos Santos Mottin, buscou reafirmar que tais direitos são fundamentais e que ocupam uma posição de centralidade em relação aos meios e aos fins do Estado, na contemporaneidade.
Lília Teixeira Santos, por sua vez, ressalta a participação do cidadão nos conselhos de políticas públicas municipais como instrumento para efetivação do direito humano fundamental ao desenvolvimento, em um contexto de Estado Democrático de Direito.
Com Lucas Coelho Nabut e Carlos Eduardo do Nascimento se identifica a crise do liberalismo na pós-modernidade, bem como, os efeitos sofridos pelos institutos de direito privado em virtude da constitucionalização, levando a necessidade de perquirir a eficácia dos Direitos Humanos nas relações privadas.
Analisar o enfrentamento da exploração sexual comercial e o modo como estão sendo desenvolvidas as estratégias municipais de enfrentamento, notadamente quando afeta à exploração sexual comercial de crianças e adolescentes foi a preocupação de Rafael Bueno da Rosa Moreira e André Viana Custódio.
Marcelino Meleu e Emmanuele Paz sustentaram o resgate do princípio da solidariedade, desde que este, contemple o conteúdo prestacionista da Declaração Europeia dos Direitos Humanos, em conjunto com o viés obrigacional da declaração africana.
O direito à liberdade religiosa diante da laicidade do Estado amparado pelo sistema constitucional brasileiro e pelo Pacto de São José da Costa Rica, especialmente, no que concerne aos símbolos religiosos utilizados em prédios públicos e por agentes públicos, ao ensino religioso em escolas públicas, feriados religiosos e transfusão de sangue por testemunhas de Jeová sustentou o trabalho de Paula Falcão Albuquerque.
A contribuição da teoria liberal de John Rawls para o embasamento teórico das ações afirmativas, e sua utilização no direito brasileiro foi a proposta de Max Emiliano da Silva Sena e Liliane Lisboa de Oliveira Barbosa.
Recordamos, com Rubens Beçak e Luís Felipe Ramos, que a efetividade dos Direitos Humanos é tema dos mais complexos, sobretudo em um ordenamento jurídico como o brasileiro, em que são muitas as garantias positivadas. Os 250 artigos da Constituição (sendo 78 incisos, apenas no art. 5º) têm, na prática, pouca efetividade, constituindo verdadeira figura de linguagem, o que contraria diagonalmente os ditames do neoconstitucionalismo, que busca atribuir efetiva força normativa aos documentos constitucionais.
A mediação enquanto instrumento de solução de conflitos comunitários, conscientizadora da comunidade, de seu direito fundamental de efetiva participação no desenvolvimento local foi tema do trabalho de Elaine Cler Alexandre dos Santos.
A comunidade indígena e seu direito de participação nas decisões sobre a exploração dos recursos minerais pertencentes ao seu território foi objeto de investigação por parte das pesquisadoras Ana Claudia Cruz da Silva e Luly Rodrigues da Cunha Fischer. Também preocupadas com comunidades assoladas com violações de Direitos Humanos, Marlise da Rosa Lui e Daniela Mesquita Cademartori, traçam uma consistente abordagem de cinco casos levados ao conhecimento e julgamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos envolvendo povos quilombolas do Suriname, Honduras e Colômbia.
Gabriel Klemz Klock e Martinho Martins Botelho analisaram a decisão proferida em 2015 pelo Supremo Tribunal Federal a respeito da inexigibilidade de consentimento prévio para publicação de obras biográficas e, se esta, importou em um incentivo para a produção de obras literárias desta natureza.
As atividades desempenhados pelo Estado, cidadãos e empresa, enquanto atores protagonistas de ações capazes de influenciar no desenvolvimento sustentável, seja na área econômica, social ou mesmo cultural foi objeto de análise por parte de Jussara Suzi Assis Borges Nasser Ferreira e Ocimar Barros de Oliveira.
Com a educação inclusiva nas escolas municipais de Aracajú, sustentada por Maria Lucia Ribeiro dos Santos e o reconhecimento da diferença e a inclusão social da pessoa com deficiência por Andréia Garcia Martin, alertam para o problema da exclusão social, e seu necessário enfrentamento para a concretização do Estado Democrático de Direito.
Gabrielle Bezerra Sales e Franciele Bonho Rieffelas destacam a influência das novas tecnologias de informação e de comunicação (tic) e o direito à desconexão como direito humano e fundamental no ordenamento jurídico brasileiro.
Com apoio na proporcionalidade apresentada na teoria de Alexy, Rogerio Luiz Nery Da Silva e Vinícius Secco Zoponi discutem possíveis conceitos oponíveis à compreensão do efetivo alcance ontológico do direito à saúde, com o objetivo de viabilizar as discussões dele decorrentes sobre sua exigibilidade.
Renata Caroline Pereira Reis Mendes e Viviane Freitas Perdigão Lima, reforçam a necessidade de análise do conteúdo dos Direitos Humanos e sua efetividade no Brasil. Tal conteúdo, como destacam Edmario Nascimento Da Silva, Gilberto Batista Santos, não pode menosprezar a defesa dos bens culturais e da possibilidade de sua ampliação como direito imaterial.
A riqueza dos debates e o compromisso epistemológico sustentado pelos participantes do Grupo, recomendam a leitura dos textos aqui apresentados à todos aqueles que se preocupam com a defesa dos Direitos Humanos em um ambiente policontextural e complexo que se situa a sociedade no século XXI.
Salvador/BA, junho de 2018.
Profa. Dra. Joana Stelzer – UFSC
Prof. Dr. Rubens Beçak – USP
Prof. Dr. Marcelino Meleu – UNOCHAPECÓ
Nota Técnica: Os artigos que não constam nestes Anais foram selecionados para publicação na Plataforma Index Law Journals, conforme previsto no artigo 8.1 do edital do evento. Equipe Editorial Index Law Journal - publicacao@conpedi.org.br.
ISBN: 978-85-5505-615-4
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