XXV CONGRESSO DO CONPEDI - CURITIBA

DIREITO PENAL, PROCESSO PENAL E CONSTITUIÇÃO III

A história dos delitos e das penas no Ocidente é terrível em termos humanitários, matéria já explorada à saciedade por filósofos, cientistas políticos e juristas, fazendo que buscassem, de forma intermitente, mudanças no sistema sancionatório ocidental. Como lembra Foucault, il tramonto dei supplizi é sentido como exigência social improcrastinável a partir da segunda metade do século XVIII, em especial na França Revolucionária, quando surge a necessidade de se punir de outra maneira da tradicional da época, abolindo o confronto físico entre soberano com o condenado e dissolvendo um pouco as tensões entre o Príncipe e a cólera do povo em face de seu intermediário (o executor) e o executado.

A interrupção súbita daquela relação sanguinária de punição, até então indissolúvel em face das relações de poder que se estabeleciam e autorizavam a violência tirânica do Rei (e seu prazer de ver o povo sofrer), paradoxalmente ocorre através do mais suave dos sentimentos, a doçura, ora entendida, na reconstrução foucaultiana, como a natural necessidade de castigo sem suplício, formulada a partir da ideia de grito do coração ou da natureza indignada, pois mesmo ao pior assassino uma coisa ao menos deve ser respeitada quando é punido: a sua humanidade.

É o homem, em suma, desprovido de seu aspecto criminal, que deve ser tomado como fundamento contrário ao despotismo da sanção-suplício, símbolo material do poder monárquico.

Hoje os juristas do século XXI são chamados à reflexão sobre estes temas enquanto parábolas da humanidade, haja vista que, por um lado, alguns modelos de pena criminal podem operar com a lógica do passado (o sistema carcerário brasileiro é uma realidade viva disto); por outro, mesmo os avanços humanistas das penas e suas execuções ainda deixam a descoberto novas tipologias de condutas criminosas preocupantes, geradas por outra Sociedade, hipercomplexa em termos de relações e seus resultados (catastróficos).

Desde o final da década de 1980 alguns sociólogos e filósofos tem discutido sobre o tema das novas configurações de forças políticas e relações sociais marcadas por níveis de complexidades altamente diferidos - como é o caso de Urlich Beck , Anthony Guiddens , Niklas Luhmann e Zygmunt Bauman , dentre outros.

Esta Sociedade se caracteriza em face de múltiplos fatores transnacionais, econômicos e culturais, com interconexões e protagonismos igualmente plurais, fazendo florescer com velocidade impar interesses e bens muito mais difusos e coletivos do que individuais, todos carentes de proteção jurídica e política.

Estes cenários, por sua vez, favorecem a aparição de novos perigos supraindividuais no cotidiano dos cidadãos. Tais perigos se diferenciam daqueles provocados pela ainda desconhecida natureza (maremotos, furacões, vulcões, terremotos, etc.); não que tenham se extinguido, por conta da inexistência de conhecimentos e informações técnicas e científicas para dar conta deles, mas provêm de tensas relações sociais e institucionais pouco controláveis por deficitários sistemas normativos de segurança (cível, administrativo e penal) existentes, provocando riscos e danos em massa, alguns inclusive comprometendo as futuras gerações (como é o caso dos danos ambientais).

Diante de tais elementos é que surge, dentre outras inquietações teóricas e práticas, o problema da imputação de responsabilidade (social, política e jurídica) pelas causas e consequências indesejadas decorrentes daquelas situações, e mesmo diante da sensação de insegurança que perpassa a cidadania quando se depara com modalidades inusitadas de ilícitos violadores de Direitos e Garantias Fundamentais – direta ou indiretamente.

Ao lado disto, encontram-se os Direitos e Garantias Fundamentais da Pessoa Humana e os paradigmas do Direito Penal Liberal, como reconhecendo a este a ultima ratio dos sistemas normativos, os princípios da legalidade estrita e taxatividade em termos de tipologias penais e sancionatórias, a subsidiariedade das ciências penais para o enfrentamento dos conflitos humanos, os déficits democráticos dos modelos inquisitórios e acusatórios do Direito Penal e Processual Penal, entre outros mais.

Todas estas questões podem ser visualizadas nos trabalhos apresentados neste GT e Revista, com alta profundidade acadêmica e reflexiva, amplamente debatidos por seus autores e interlocutores nos grupos de trabalho que ocorreram nos dias 08 e 09 de dezembro de 2016, em Curitiba, o que pretendemos agora socializar com o publico leitor brasileiro e internacional.

Prof. Dr. Felipe Augusto Forte de Negreiros Deodato - UFPB

Prof. Dr. Rogério Gesta Leal - UNOESC

ISBN: 978-85-5505-323-8


Trabalhos publicados neste livro: